O Araguaia voltou a sorrir!

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Livre do burburinho de uma suposta usina, dos ruídos das dragas, o rio, boquiaberto, balançava em seu dorso as folhas secas que se soltavam dos galhos ribeirinhos seguindo firme sua rota muitas vezes curvilínea, mesmo assim, ainda caia nas eivas profundas impregnadas em suas margens. O rio sob ameaça humana ainda tinha a difícil missão de cruzar a barreira da solidão imposta pelo ambiente selvagem e muitas vezes inóspito. Ao vê-lo lá fotografado via satélite, fotos estampadas no jornal, em alguns pontos, o rio parecia morto e em outros, naufragava em seu próprio leito. Isto poderia até ser obra da minha imaginação fértil, mas não é.

Hipérbole de sua própria nuança, depredado se  tornaria no futuro apenas a tumba sórdida dos esquecidos. Mas, se majestoso, certamente continuará servindo de palco, onde encenará, sem coadjuvantes, alguns atos adornados de areias brancas apinhadas de gente. Um rio magnífico que possui em suas águas grande quantidade e diversificados cardumes de peixes que saciam a fome da população ribeirinha. Rio que não chora mais, pois as lágrimas ressequidas foram levadas pelas pequeninas ondas que jazem sobre barrancos enraizados. Ele já não sente mais   pesadelos e nem a aflição do último veio que se esgotava no curso do seu próprio silêncio quando se encontrava à espera da construção de uma Usina Hidrelétrica, que se construída, lhe restaria para servir,  numa taça quase vazia a cicuta de quem aí irá beber na sequidão do vale, até a hora do cortejo fúnebre dos depredadores que hoje sentimos o prazer de vê-los derrotados por um simples veto do IBAMA.

A última tentativa de destruí-lo já se foi. E eu espero que sim, não obstante saber que ainda existem os homens “lodos”, sugadores de leitos para extração de areias, destruindo as margens ribeirinhas dando um fim as águas límpidas e ao homem o gosto salobro de uma tarde devorada pela mediocridade. Célere e constante o rio segue manso sobre o leito abraçando suas próprias asas caudalosas como um pássaro, que perdido na imensidão celeste, não sabe como se esconder na última curva sustentada por alabastros e ou raízes de árvores milenares. Parece um pêndulo esférico à procura de um abrigo, ou uma tora solta uma vez que ele não conseguirá manter-se indeciso entre continuar ali pairado, ou flanando alto até cair em cachoeira. 

Flutuando sobre o leito, sepulcro das águas paralíticas, tudo que lá jaz, parece se acomodar tão lentamente, quanto às palavras impuras contidas na muda história de uma gente ribeirinha. Mesmo que se bastem, as imagens vistas do alto precisam ser tocadas pelos nossos sentidos como aconteceu com a Ministra do Meio Ambiente. Mas o tempo foi passando e as águas também, protelando uma decisão ministerial que na última hora, mediante bom senso, decidiu-se definitivamente que no Rio Araguaia não se construirá Usina Hidrelétrica. Felizes com a decisão restarão aos amantes da natureza palavras poéticas cheias de perturbadoras imagens, tanto e quanto o sonho dele de se ver salvo pelo  homem que se materializou devagar, devagar, até que fosse hasteada a bandeira de sua vitória.

Semana passada, dia 21 de outubro, no jornal Diário da Manhã, juntamente com outros abnegados ambientalistas, fiquei feliz com o título “Vitória do Araguaia”, estampado na capa com letras garrafais, e com a maior serenidade possível, cheguei à conclusão de que o caminho em defesa desse rio não tem atalhos, e a metáfora do sonho pode ser a foz ou o abismo. Pelo abismo passarão só as imagens de entes nocivos e depredadores, sem palavras, mudos e as novas águas nem perceberão eles fazerem a travessia. Para quem das águas retira o sustento, os leitos sadios serão os caminhos naturais; para quem lá navegam sobre canoas verão que são os leitos que potencializam as riquezas nacionais. Mas, para que tanta pressa, se ninguém nos espera em lugar algum! 

Até as toras milenares se não forem cuidadas pelo homem também apodrecerão nas próximas correntezas. Mas como poderemos ser coerentes se ao mesmo tempo somos algozes e vítimas da natureza, usuário das benesses do tempo e impávidos como o sol primaveril que despenca sobre nossas cabeças queimando nossa massa cefálica, ou os sensíveis   cavaleiros ambientalistas que iniciaram suas longas cavalgadas partindo da nascente, repetindo as   mesmas curvas e trajetos no afã de  proteger suas margens e fazê-lo voltar a sorrir com as boas novas. Mas, repito, para que tanta pressa se agora está livre e sabemos que ninguém o espera em lugar algum a não ser receber outras águas

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