Como a um pássaro aventurei-me
por aquelas brenhas selvagens, embora perigosas, banhei-me nas águas revolta do
Rio Babilônia, pesquei lambaris em suas águas piscosas, entreguei-me a amassos
imaginários de uma linda mulher cujas bolhas de águas envoltas em seu corpo
eram levadas pelo vento, e o belo vulto iluminado pela luz tênue do sol e
adornado por folhas secas caídas de árvores milenares, emergia e imergia
naquelas águas profundas, num vai e vem inesquecível. O rio, eu e minha canoa, assim
como o esbelto corpo, seguíamos céleres para além de mais além, enfrentando
curvas, recepcionando brisas vindas de outros rincões e sob o cantar dos
pássaros, parecia querer mostrar a aqueles que passaram e viveram o amor, que
naquele local jamais existiria violência, poluição ou a brusquidão do quente
asfalto de uma cidade. Aos incautos, o rio sempre dizia que as aves que outrora
gorjeavam foram também para mais além, onde o ser humano jamais poderá
aprisioná-las e nem fazê-las ouvir o ruído infernal de suas máquinas insones.
O rio, para
além de mais além, onde a natureza não mostrará sua face, onde não se ouvirá
suspiros nem gemidos, onde não se verão cidades incharem, onde não se
respirarão o mesmo ar do ser humano, seguirá navegando sobre o seu próprio
leito mesmo sinuoso, suscitando sons inebriantes, poéticos, sob o silêncio
sombreado das árvores que debruçam sobre suas águas límpidas e deleitam em suas
rústicas margens, cujos momentos de nostalgia me fez recordar de coisas
obscuras impregnadas no meu cérebro há tempos, e com emoção à flor da pele,
restou-me quedar diante daquele ambiente místico e esquecer-se dos sustos da
cidade, das enfermidades, da violência, da criminalidade e dos cotejos de
morte.
Naquele recanto
aprazível tentava fugir do real, encaixotar de vez minhas ansiedades, aflições
e sensações oriundas de um mundo profano e de certa forma, procurar entender a
própria existência do homem no universo e acreditar firmemente na existência de
Deus. As atitudes de cada um por mais crentes que forem, considero que a
demonstração de fé, caso não seja rejuvenescida ante ao Criador, continuará
sendo apenas uma gota de orvalho que não tem mãos para levantar aos céus e
pedir ajuda, pois rapidamente se evaporará sob os raios de sol. Não importa se
vamos mais além para ouvir e assistir o nascer de um novo amanhã, e ou se por
extrema necessidade, termos que usar asas para voar no afã de visualizar nesse
amanhã uma vida nova, e possivelmente, numa curva qualquer, encontrarmos a fé
em Cristo que tantos procuramos.
O sol se pôs no horizonte entregando-me a lua que já
nascia soberba detrás da densa mata. Não obstante o palco mostrado pela
natureza se diversificasse a cada momento, o rio seguia seu rumo e eu o
acompanhava com olhar complacente de um admirador. Era óbvio que ele passaria
por serrados ingentes, matas e mais além, encontraria queimadas praticadas pelo
próprio homem. Sabia que o fogo atiçado sobre o capim e galhos secos tornaria
suas chamas ardentes, implacáveis, os quais, silenciosos, quedariam esbatidos
sobre a terra que chorava de dor. Por mais que procurasse me aquietar naquele
poucos dias de férias não conseguia ficar indiferente e como ambientalista
precisava agir não obstante saber que a vida humana é cheia de contrastes em
relação ao ambiente em que vive. A sua ação devastadora fez-me voltar ao meu
mundo real, esquecer aquela imagem surreal, dos mistérios e mitos contados por
moradores ribeirinhos para poder soltar os pequenos flashes guardados em minha
mente, onde se encontram níveis insuportáveis da violência, de corrupção sem
controle, de descrédito absoluto da classe política, de apagão ético e moral e
de toda a sorte de agruras que o cidadão vem enfrentando, impotente, sem ter a
quem recorrer. A sociedade está órfã e este fato me fez “cair na real” e
“viajar” para além de mais além, inerme, em busca de meu mundo incógnito.
0 comentários:
Postar um comentário