Voando nas turbulentas alturas.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Através da pequena janela podia se observar na torre de controle alguém autorizar a decolagem. Autorizado, o piloto liga a turbina e o avião desliza pela pista numa velocidade considerável soltando sobre o asfalto uma fumaça esbranquiçada, mas, no momento certo, sustentado pela força da gravidade, levanta seu bico rumo ao céu, naquele instante, parcialmente nublado. A poucos mil pés de altura, pequenas gotas de chuva deslizam sobre a pequenina à janela e logo, dado a velocidade e altura, o pássaro de aço deixou para trás os respingos de chuva, enquanto, sentado confortavelmente na poltrona, observava atentamente a terra e a amplitude do universo que nem sabemos ter fim. As nuvens não assustavam mais esse objeto composto por turbinas e fuselagem em forma de charuto, sustentado por um par de asas que transportam em seu interior pessoas de todas as idades e regiões brasileiras e quiçá, alguns, até outros países, todos quietos, concentrados em alguma coisa, e olhando em seus semblantes, notava que cada uma delas carregava consigo, esperanças, desilusões, mágoas, ansiedade e medo. Algumas pareciam voar pela primeira vez, pois via nos seus rostos certa apreensão e, principalmente, quando apareciam pequenas turbulências que dava um pequeno, mas diferente cadenciado ao voo da imensa aeronave.

Ela seguia calmamente rumo à Argentina, pousando calmamente, e horas depois, pegamos outra aeronave e seguimos rumo ao Chile, cujas rotas já estavam traçadas na minha planilha de voo. A aeronave não balançava quando fazia o trajeto sul, permanecia firme, nem sei a quantos mil pés de altura, pois só enxergada através da minúscula janela, nuvens, ora negras, ora brancas, algumas delas mais pareciam algodão. Dentro, os passageiros ainda se ajeitam nas poltronas, inquietos, alguns tensos, outros com os olhos parados no tempo e um sono por quebrar. Um homem de cabelos grisalhos, com o rosto já carcomido pelas intempéries do tempo rezava em silêncio manuseando a Bíblia, enquanto lá embaixo, mesmo ainda no Brasil, podia-se ver a terra sendo devastada por queimadas, desmatamentos, mostrando sua face minúscula cicatrizada, mas ainda podíamos ver lindas serras, milhares de meandros, savanas, lagos e dezenas de rios que iam ficando para trás, algumas vezes, desapareciam debaixo de imensas nuvens, ficando totalmente diminutos, lagos, represas e rios, alguns sem volume d’água, tornando-se apenas pequenos riscos sinuosos em face da altura do avião. “A coincidência é que eu estava indo participar de um Congresso na Universidade do Chile e justamente o meu tema era meio ambiente, coincidência ou não, o livreto e vídeo intitulado: “O Grito Silencioso da Mãe Natureza” que tinha produzido e levava em mãos, falava justamente sobre o que estava observando lá do alto.

O pássaro de aço seguiu seu rumo e durante alguns segundos uma turbulência, explicada pelo piloto que se tratava apenas de mudança de altitude. Um simples barulho bastava para deixar alguns tensos, mesmo diante do silêncio que pairava no ar. A cada instabilidade da aeronave olhos se abriam e faces empalideciam. Mas, logo, veio a calmaria a 37mil pés, e sorridente, veio uma jovem, comissária de bordo, empurrando um carrinho com habilidade e sem nenhum medo no olhar; depois escutou alguém reclamar de alguma coisa e nem percebeu ou se fez de indiferente quando jovens trocavam carícias nas últimas poltronas. Nem pareciam sentir os problemas que afligiam cada um.

Vejam só caros leitores: O homem construiu máquinas incríveis, inimagináveis, bem como esses pássaros de aço que encurtam distâncias e suavizam nossos sofrimentos algumas vezes maltratados por uma longa viajem numa estrada de chão. O tempo passou sem que fosse notado e logo ouvimos a voz do piloto anunciando a chegada, e poucos minutos depois, a torre de controle autoriza a aterrissagem. A nave desce bruscamente rangendo os freios sobre o asfalto e depois segue lento rumo ao portão de chegada. Antes de descer, ainda olhei pela janela embaçada pelas gotas produzidas pela neblina que cortava o céu. Tudo era belo e a obscuridade de antes, era interrompida pelas luzes que delineavam a pista do aeroporto e por pequenas aeronaves que desciam e levantavam voos.

No saguão do aeroporto, menos aflitos estavam os rostos daqueles que ainda iam seguir rumos diferentes. Sai caminhando lentamente e deixei para trás aquelas pessoas que qualquer dia poderia encontrá-las novamente no mesmo trajeto e escutar as mesmas lamentações, as mesmas aflições e aquele medinho de viajar de avião. E entendível que faz parte do ser humano e muitos deles não conseguirão despistar o seu medo, por mais que acreditam em Deus. A mente e o coração da pessoa humana são frágeis e incapazes de seguir essa barra e carrear com fervor a emoções vividas de forma que não mais venha sentir medo. E não adianta fugir da realidade, pois todas as sensações, ansiedades aflições, fenômenos físicos e mentais que ouvi e assisti durante a viajem foram importantes para que possamos entender a existência do homem no universo e, por outro lado, se realmente ele acredita na existência de Deus. As atitudes demonstradas por cada uma delas, por mais que acreditassem em Deus, considero que essa demonstração de fé, caso não seja rejuvenescida ante o Criador, continuará sendo apenas uma gota de orvalho que não tem mãos para levantar aos céus e pedir ajuda, pois sabemos que rapidamente se evapora sob os raios de sol.

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