No
ano de 2015, em uma crônica, fiz um breve comentário dizendo nas entrelinhas o
quão é difícil o fazer literário. E mais difícil ainda é quando delineamos o
tempo para conduzir as palavras pelos meandros do texto para que uma crônica
não seja apenas mais uma ou uma entre tantas outras que se publicam diariamente
em revistas e jornais. Escrever é como andar sobre pedras pontiagudas sem
senti-las. E quando escrevemos temos que fazer de tudo para evitar que fiquemos
à deriva, seja por efeito de um deslize na forma de escrever, seja também na
formatação ou finalização do próprio texto para que o mesmo não fique se nexo.
Quanto às pedras no caminho hão de convir que elas existam, dificultam e
impedem a nossa passagem de um estágio a outro e não importando em qual
momento. Vencendo-as, no entanto, e ultrapassando-as, deslocando-as do caminho,
haverá inevitavelmente a descoberta da realidade da vida, por mais cruel que
for.
O dicionário define a crônica como uma narração curta, produzida essencialmente para ser
veiculada na imprensa, seja nas páginas de uma revista, seja nas
de jornais. Possui assim uma finalidade utilitária e predeterminada: agradar
aos leitores dentro de um espaço sempre igual e com a mesma localização,
criando-se assim, no transcurso dos dias ou das semanas, uma familiaridade
entre o escritor e aqueles que o leem. O cronista se inspira nos
acontecimentos diários, que constituem a base da crônica. Entretanto, há
elementos que distinguem um texto do outro. Após cercar-se desses
acontecimentos diários, o cronista dá-lhe um toque próprio, incluindo em seu
texto elementos como: ficção, fantasia, imaginação, surrealismo e ceticismo,
elementos que um texto essencialmente informativo não contém, mas quando se
inclui esses elementos essenciais, e com perfeccionismo, jamais o cronista
ficará à deriva. De outra parte, cronista pode ser considerado o
poeta dos acontecimentos do dia a dia. A crônica, na maioria dos casos, é um
texto curto e narrado em primeira pessoa, ou seja, o próprio escritor está
"dialogando" com o leitor. Isso faz com que a crônica apresente uma
visão totalmente pessoal de um determinado assunto: a visão do cronista. Ao
desenvolver seu estilo e ao selecionar as palavras que utiliza em seu texto, o
cronista está transmitindo ao leitor a sua visão, a forma que vê a vida e como
enxerga de mundo. Ele está, na verdade, expondo a sua forma pessoal de
compreender os acontecimentos que o cercam.
Eu
penso assim: Um cronista é como um rio, ora pode ser largo, ora estreito, pois
cabe no seu leito apenas aquilo pode ser dirigido, orientado de modo a não
colidir com outros objetos que porventura naveguem no mesmo espaço. No entanto,
se uma simples canoa se encontrar à deriva e não tiver timoneiro, ela será
arrastada pela corrente e será um perigo constante para os que no mesmo espaço
navegam. No que tange ao cronista é nessa comparação que se vislumbra também
certo perigo, fato que ele deve atentar-se, dirigindo a leitura de forma suave,
agradável, concisa, inteligente, de forma que venha alcançar o coração e
compreensão dos leitores.
Um
rio navegável, não muito largo, não muito comprido, mas repleto de canoas,
barcos e outras embarcações afins, com pessoas a bordo em busca de um porto
seguro onde se abrigam temporariamente, mas sem um timoneiro que os guie,
causaria uma confusão tremenda, assim como, também, comparativamente, seria uma
tremenda confusão se o cronista fizesse de seu texto uma salada mista sem
tempero acompanhado de um amontoado de letras salgadas com uma finalização sem
nexo ou conclusão que satisfaça ao leitor. No entanto, internamente, as
embarcações lutam para encontrar um comandante capaz de ler uma carta náutica,
de interpretar mapas, de traçar os rumos que as levarão a um porto seguro. Já o
cronista depende somente dele, mas em sã consciência ele sempre pretende saber
mais do que realmente sabe, mas isso é bom, pois exigirá dele muita pesquisa.
Como dirigir um barco destes? Como escrever uma crônica que satisfaça a
maioria? O cronista às vezes precisa de tempo. O barqueiro treinado e
experiente não. São situações nunca imaginadas. Quem diria?! Agora, o cronista
já com rumo certo, assim como, os timoneiros, são óbvios que cada um vai
procurar encontrar o seu rumo e a seu modo encontrar o porto onde pretendem
desembarcar. Durante muito tempo barcos andaram a deriva procurando o
comandante certo. Mas quanto ao cronista, navegador de rio tão pequeno, mas
rico que é a escrita, onde muitas pessoas navegam em busca do saber, é preciso
ter em conta o espaço cultural e material de leitura condizente com a realidade
para não haver colisões intelectuais! Entretanto, cá entre nós, o melhor é não
se aproximarem muito de um cronista quando está em fase de fuga intelectual,
atormentado com alguma coisa ou em um precário desenvolvimento do texto. Ao
vê-lo assim, num porto inseguro, peguem um atalho e se não puder, desviem-se
dos que vêm em sentido contrário. Todo cuidado é pouco com um cronista à
deriva!
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