Não
adianta mais gritar. Hoje ninguém pára pra ouvir. Apenas fazem mímicas, movem
os lábios em busca da atenção das pessoas mesmo estando ao lado. Mas se a
pessoa é cega e ainda pobre, pois se rico, tem ajudante, cadeira de rodas e até
mordomo. É interessante o que eu quero dizer não acha? Dizer algo que você nem
ouve ou tem interesse de ouvir. Será que assim é melhor? Não incomoda as
pessoas que estão ao seu redor, ou não quer que elas ouçam. Pois é. Goiânia é
uma bela cidade em que muita gente fica incomodada com tudo, mas tem que se
incomodar, pois todos os dias assistem noticiários falando sobre assassinatos,
roubos, assaltos à mão armada e como conseqüência, a morte de inocentes. Dias
atrás uma jovem foi assassinada covardemente por não entregar o seu celular ao
bandido. Ela não era pobre, mas isto não importa, o que importa é que a
criminalidade está crescendo e realmente incomodando. Assaltam até cegos, mas
vejam o que a sociedade encontra: pessoas maltrapilhas pedindo esmola para
matar a fome, situação que deixa a gente com o estômago embrulhado. Certo dia
eu escutei uma pessoa dizer a outra que teve câncer depois de comer alguma
coisa estragada, fornecida por um empregado de restaurante de periferia.
Muito
preocupante isso. Ter que me deparar com essa situação logo após meu
café-da-manhã. Nem mesmo o mamão se sentiu bem no meu estômago depois que ouvi
isso. É muito triste mesmo ver certas cenas logo de manhã. Impressiona também é
a falta de sensibilidade que alguns governantes em relação a estes problemas.
Se pelo menos não enxergássemos tanta pobreza como o cego... Deveriam, pelo
menos, inventar óculos escuros anti-pobreza. Felizes são os cegos que não
enxergam a pobreza, mas piores são aqueles que enxergam ou fingem que nada vê.
Enquanto
meus olhos tentam se acostumar com tanta luminosidade, o corpo aquieta diante
do ventilador que ameniza o calor. As pontas dos dedos eu as esquento
manuseando o mouse ou digitando o teclado do computador que chega a ser
inquietante ter que descrever tanta gente circulando freneticamente como se
fossem cegos e outros fingindo não ver: os de terno que caminham em passos
firmes, enquanto os descalços esticam as mãos, suplicando por alguns trocados.
Os cheiros
de flores, de mofo, café fresco, sabonete barato, xixi e cocô de cachorro nas
calçadas, perfume francês usada por uma transeunte, se misturam. No bosque, uma
cigana me interpela e promete me entregar o nome de duas amigas falsas em troca
de uns trocados. Mas não carregava dinheiro, estava sem lenço e documento.
Todavia, fiquei encabulado e exclamei: Que amigas falsas, se eu não tenho!? Ao
seu lado, numa pequena banca, improvisada com isopor, vejo muitas bugigangas,
cartas de tarô e outros utensílios para mim desconhecidos, mas que me despertam
para a realidade.
O relógio
despertador toca sem parar, um barulho estranho para um simples relógio. Fujo
daquele mundo estranho, insípido, inodoro e incolor, pois era hora de continuar
com a caminhada matinal e estar desperto para aquelas coisas. Os olhos que se
arregalavam, tentando decifrar o intento da cigana, o seu vai-e-vem de quem
sabe o que quer, para onde quer ir ou chegar. Tudo se movimenta muito rápido e
demoro a apressar o passo. As pessoas no calçadão vejam só, se mexem tal qual
números, os números que tento acompanhar por mais ou menos uma hora tempo que
dura a minha caminhada. Alguns delas são loiras, morenas, e outras nem cor têm
talvez tomadas pela palidez de uma grande e cansativa caminhada.
Alheia a
tudo isso, ainda se vê uma menina caminhando de mãos dadas com seu avô, de mais
ou menos três anos, faz graça querendo andar na ponta dos pés, atravancando a
passagem dos apressados. Ouvem-se resmungos, alguns avançam pela calçada. É a
intolerância dos que precisam correr, não pelo exercício físico matinal, mas
para pegar o ônibus, engolir a comida a quilo ou simplesmente voltar a
trabalhar numa das empresas que os recebem com um relógio de ponto. Enquanto o
corpo se aquece e os olhos se acostumam com o visual, faço a trajetória
inversa. É hora de voltar. Uma senhora com cara de índia, sentada frente a um
prédio, segura uma criança adormecida nos braços. Um cachorro magro de dar dó
faz xixi na calçada e nem se dá conta do aviso que proíbe fazer o mesmo sobre a
grama. Nessa hora, cruzo com um colega do trabalho que está saindo de uma
farmácia e com um sorriso sarcástico e uma expressão de um gozador, me avisa:
Caro amigo escritor: "O Lula acaba de ser preso pela Polícia Federal, a
Dilma foi cassada pelo TSE e a as passagens de ônibus baixaram”. Continuei
caminhando e só ouvia “panelaços” e “buzinaços”. Eram pessoas comemorando a
ação da PF, todavia, a passagem não tinha baixado e nem a Dilma sido cassada
ainda.
Vai em frente, escritor.
ResponderExcluirQue a "gota d'água" do panelaço transborde para o que for util, benéfico, positivo para nossas realizações patrióticas.
ResponderExcluir- Muita paz, escritor!
- Paz inquieta...
Que a "gota d'água" do panelaço transborde para o que for util, benéfico, positivo para nossas realizações patrióticas.
ResponderExcluir- Muita paz, escritor!
- Paz inquieta...