Deitado à
sombra de um pequizeiro, dormi. Sob o sopro do vento que acariciava meu rosto
de repente me senti mergulhando num sono profundo certo de que ele queria me
mostrar alguma coisa, e assim, preguiçosamente, meu corpo reagia às intempéries
impostas por um sol escaldante e vento forte que fazia levitar as folhas secas
caídas sobre o úmido capim, levando-as para outras plagas e sombras de uma
árvore qualquer. No sonho vi caracterizado em espelhos d’água um mundo desigual
e eles me mostravam vívidos detalhes de pessoas paupérrimas, injustiçadas,
oprimidas, mulheres agredidas, gente discriminada, trabalhadores explorados,
gente faminta e sem terra pra morar e plantar; o espelho mostrava guerras,
catástrofes, criminalidades, ditaduras espalhadas pelo mundo, repressões e
tantas outras imbecilidades que me fez acordar em sobressalto, sonho ou quiçá,
pesadelo, que me deixou pensativo e sem forças para ajudar a combater tanto
mal.
O vento
continuava roçando as folhas das árvores e uivava forte, enquanto a sombra já
circulava por outros recantos. Veio-me uma angústia que me oprimiu. Lembrei-me
de um texto do Evangelho que falava de Simão e André. Eram pescadores e Jesus
os chamou para serem pescadores de homens. Tudo o que eles precisavam fazer era
segui-Lo e foi aí perguntei a mim mesmo: Quantos anzóis ou redes serão precisos
para pescar toda essa gente sofrida? Naquele instante me senti incapaz de
acudir alguns, mesmo sabendo que detinha naquele inesperado sonho a força
divina que impulsionava todas as minhas ações. Aqueles imensos espelhos d’água
pareciam querer me mostrar que eu vivia num mundo irreal. Parecia absurdo, mas
era verdade. No mundo tão belo e rico que se estampava diante de meus olhos
existiam crianças passando fome, pessoas sem condições mínimas de plantar para
a sua própria subsistência; meninos e meninas perambulando pelas ruas,
cheirando cola para enganar a fome. Esperava que aquelas cenas fossem apenas
“coisas” obscuras represadas na região recôndita de meu cérebro, mas não eram.
Cenas mostravam crianças e mulheres que se prostituíam para sobreviverem;
noutras passagens, o espelho realçava a Terra sendo destruída pelo próprio
homem; chacinas, roubos seqüestros, corrupção, abuso do poder econômico, isto
não é irreal ou utopia, é pura realidade, uma realidade que se alastra como se
fosse uma coisa natural característica da própria espécie humana.
Diante
daquele sol escaldante e sem a gostosa sombra, apenas recebendo no rosto o
sopro do vento, senti que era necessário resgatar da memória do tempo os bons
fluídos, as riquezas e criatividades produzidas por muitas pessoas cristãs,
criteriosas, que pode fecundar esses momentos de reflexão e ajudar a delinear e
modelar novos conceitos de vida em face do processo atual, uma vez que, às
vezes, encontramos preceitos e normas de comportamento que estão fora de época.
O mundo se globalizou então é importante que se recupere a moral dos homens e
lhes dêem condições de acompanhar as rupturas que a história maleficamente lhes
impôs durante milênios. De outra parte, entendemos que cada pessoa deve se
tornar sujeito de sua própria história, de sua própria libertação,
transformando a sua realidade com a finalidade de efetivar a justa liberdade
coletiva, ainda que de maneira deficitária.
Naquele
momento de reflexão, já sem as benesses de uma sombra, mas ainda sob o sopro e
uivos do vento, comecei a entender realmente que não só a sociedade brasileira
está na UTI, mas todo o planeta Terra. A doença do egoísmo e da maldade domina
todo o sistema, onde, de forma excludente, não se consegue realçar a
solidariedade como valor extremamente capaz de forjar um mundo mais humano e
fraterno. È necessário que a perda progressiva do seu senso ético e o próprio
individualismo, um mal que se predomina entre os homens e que todo sofrimento
do povo mais fraco, indefeso, deve ser retirado com a inserção do bisturi do
amor, alicerçado na raiz da justiça mesmo sabendo que ela está sendo corroída
dia a dia por decisões que contrariam os dispositivos constantes na legislação
de uma forma geral e na própria Constituição Brasileira. Penso como o
internauta Marcos Marques: “A decisão mais justa proferida por um magistrado
não é aquela extraída nos grilhões dos textos legais, mas aquela que não
retalha sua toga, não fere sua alma e trás paz em sua consciência.”
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