Quando
adolescente eu saía equilibrando sobre tudo, nem praticava equilibrismo ou
trabalhava em circo, mas não havia muros, cordas, meios fios ou qualquer coisa
que segurava as minhas peraltices, no entanto, o que mais gostava era caminhar
à esmo, sem rumo, à beira de estradas e sobre trilhos de ferro. Como naquele tempo eu não tinha nenhum meio
de comunicação, como ocorre hoje em dia, o jeito era colocar os ouvidos sobre o
trilho e tentar escutar pelo menos os passos daquela linda menina de olhos
verdes que conheci num campo de futebol em uma cidadezinha que distava mais de cinquenta quilômetros da minha. Algumas vezes, escutava o barulho do trem e o
meu coração acelerava esperançoso de vê-la descer na estação. Escrevia cartas,
e como escrevia!... Até me tornei um pequeno poeta, assim diziam as meninas da
vila. Mas cansado de tanto esperar, certo dia, num vagão abandonado desenhei um
coração e dentro dele escrevi nossos nomes usando cores rubras, as quais, com o
passar dos anos não resistiram às intempéries do tempo e se esvaíram como se
esvaiu a dor e a saudade de sua eterna ausência. Tempos passaram como passaram
nossas vidas, mas certo dia a vi. Eu era um adolescente que enxergava o
amor nas mínimas coisas e realmente anotava tudo num caderno cheio de frases
poéticas, próprias de um menino sonhador. À medida que ia andando sobre
os trilhos, abria o peito para receber o vento que enchia meus pulmões
impregnando-os de perfumes vindos das matas e das flores que brotavam estrada
afora.
Às vezes,
dava uma pausa para observar o movimento dos pássaros, enquanto o sol
escaldante ia queimando o meu rosto e o peito nu. Ao entardecer me deliciava
quando ele descia soberbo por detrás do montes emitindo raios multicoloridos,
ora alaranjados, ora vermelhos, ora formando um arco-íris, que iam sendo
retalhados entre os galhos e folhas da verdejante mata que circundava a
estrada. Sentia uma sensação inigualável, inexplicável, algumas vezes, nem
sabia como, aparecia diante de mim o rosto angelical daquela menina moça que se
refletia por entre as folhagens coroada pelos raios solares daquelas
encantadoras tardes de primavera. O seu sorriso angelical era parte integrante
do cenário, que de tão perfeito, parecia onírico. Mas, naquele tempo, ao caminhar
pela “estrada da vida”, não soube escolher o caminho certo. Talvez, enxergava
certas coisas de uma forma, não como hoje, que calejado em face da labuta
cotidiana, passei a ver de outra, não porque tudo tenha mudado, mas porque a
minha forma de interpretá-la é que mudou.
A “estrada
da vida” se esticou assim como o tempo que passou e marcou os nossos rostos
deixando-os carcomidos. A estrada que percorremos fez-nos deixar
para trás muito choro sufocado e muita injustiça a ser vencida. Mas, seja qual
for à estrada, se de chão ou de ferro, nem sabemos em que parte dela a dor deve
ser curada, sabemos que ela nos conduzirá ao mesmo lugar e trafegar ou
equilibrar sobre ela é o que se questiona. Podemos até passar rapidamente
ou devagar sobre ela, não importando a velocidade que imprimimos. Podemos
causar impactos, sentimentos vários nas pessoas ou em nós mesmos. Podemos
encontrar durante nossa caminhada dias nebulosos, ventanias, sol extremamente
quente, noites e dias frios, pedras, espinhos e até pessoas que passam por esta
mesma estrada, umas com semblantes rancorosos, outras distraídas, venenosas,
falsas, egoístas e outras cheias de amor, mas, todas sabendo, que no final da
“estrada” todos terão o mesmo destino: rostos envelhecidos, cabelos grisalhos,
corpos curvados para não dizer que chegaram à velhice e como final, a morte,
para uns, o descanso eterno, para outros, é vida nova no paraíso, mas, para
mim, é somente a certeza de ter conseguido chegar ao fim da estrada ileso e
pagando menos “pedágios”.
Tem dia
que caminhamos ou sentamos na beira da estrada e deixamos o vento levar nossos
pensamentos sem pedir licença. Tem dia que pegamos pétalas de rosas à sua beira
e elas nada exalam. Tem dia que vemos passar por ela marés de incertezas e não
reagimos. Tem dia que tentamos encontrar outra estrada e sonhar um sonho que
almejávamos sonhar, mas não conseguimos. Tem dia na estrada que a noite é
pesada demais mesmo sem termos pesadelos. Tem dia que nos lembramos
do passado sem assombros, um passado limpo, mas, tem dia que o vemos cheios de
escombros. Tem dia que perdemos alguém na “estrada” que muitas vezes não
dávamos o devido o valor. Tem esses dias... Ah, se tem!
À beira da
estrada nem chequei a delinear nada pra mim, apenas fiquei com o pensamento
absorto olhando para o infinito céu e foi aí que percebi que o nosso passado é
a estrada que percorremos durante toda a nossa existência e este aspecto não
devemos esquecer. Foi através desta caminhada longa, entre erros e acertos, com
realização profissional ou não, que cheguei onde estou ou encontrar a
felicidade ao longo dela, assim como, o amor e realizar alguns sonhos, talvez
com pesados “pedágios, tributo que a vida sempre nos impôs e ainda impõe fatos
que talvez nos dificultem alcançar outros sonhos e objetivos antes de
alcancemos o seu final.
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