Eu sempre pensei assim: Um cronista é como um rio, ora pode ser largo,
ora estreito, pois cabe no seu leito apenas aquilo pode ser dirigido, orientado
de modo a não colidir com outros objetos que porventura naveguem no mesmo
espaço. No entanto, se uma simples canoa se encontrar à deriva e não tiver
timoneiro, ela será arrastada pela corrente e será um perigo constante para os
que no mesmo espaço navegam. No que tange ao cronista é nessa comparação que se
vislumbra também certo perigo, fato que ele deve atentar-se, dirigindo a
leitura de forma suave, agradável, concisa, inteligente, de forma que venha
alcançar o coração e compreensão dos leitores.
Partindo deste pequeno preâmbulo posso dizer que sou apenas um rego d’água que durante seu percurso é
abastecido por várias minas, para, finalmente, cair em cachoeira. Essa
cachoeira é minha salvadora, pois é nela que deposito meu saber. Insuportável,
no entanto, é saber que ele tem a permissão minha para ser juiz da minha
existência. No seu leito deslizam águas que alimentam o meu espírito. Se for
assim, então será que sua majestade o sol que ilumina meu caminho, poderia
abrir meus olhos e mostrar quem sou e porque me tornei cronista aqui neste
rincão? De certo modo há de se suportar a alegria daqueles que não conseguem
deslizar sobre essas águas mansas, mas que, de alguma forma, se divertem,
inconscientes do impacto que seus prazeres têm sobre a alma de um cronista.
Sim, sob o olhar do sol escaldante eu me evaporaria de emoção... Ficaria feliz,
imensamente feliz se cada uma de minhas escritas se evaporasse, e evaporada,
tocassem, como suores ou mesmo como lágrimas, a sensibilidade de meus leitores.
Tomara que
sob o olhar do sol mesmo em pleno inverno não ocorra apagões em nossa memória e
não sejam capazes de encobrir por muito tempo o nosso real desiderato: o gosto
pela escrita. Toda vez que o coração do cronista se resfriar, a respiração se
fizer áspera demais e o momento da gente descobrir maneiras para se cuidar. Que
lá no fundo, bem fundo mesmo nos reste sempre uma brecha qualquer, ínfima,
tímida, para ver também um bocadinho de céu bem azulzinho escancarando em nossa
direção os olhos do sol. Tomara mesmo que os nossos enganos mais devastadores
não nos roubem o entusiasmo de escrever para que possamos semear sobre o chão,
letras e mais letras. Que a lembrança dos pés feridos, mas valentes, que usamos
descalçar os sentimentos, não nos tire a coragem de voltar a ter confiança no
futuro. Mas se doer muito que nossos pés e o corpo encontrem um lugar para
descansar em paz na região mais calma da nossa mente. O medo existe, mas que
não seja tão grande para ceifar o nosso amor pela escrita. Tomara que a gente
não desista de ser quem somos, por nada, por nem ninguém deste mundo. Que a
gente reconheça o poder do outro sem esquecer o nosso. Que as mentiras alheias
não confundam as nossas verdades, mesmo que as mentiras e as verdades não sejam
permanentes. Que friagem nenhuma nesta estação seja capaz de encabular-nos
diante do olhar do sol que nos traz um calor gostoso e que, mesmo quando
estiver queimando nosso rosto, não o percamos de vista, nem de sonho a ideia da
alegria. Tomara que apesar dos pesares a gente continue sendo valente o suficiente para não abrir mão de sermos felizes.
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