Adolescente,
saía caminhando sem rumo pela estrada aguçando os ouvidos para ouvir o canto
harmonioso dos pássaros e o apito inebriante da locomotiva avisando de sua
chegada na última estação. Em alguns momentos parava no acostamento para
escutar o barulho cadenciado sobre os trilhos e quando ouvia, meu coração
acelerava esperançoso em saber que aquela linda menina já estaria lá à minha
espera. Quando a conheci pela primeira vez naquela estação, tivemos apenas uma
troca de olhar e foi amor a primeira vista. Começamos a ensaiar um romance que
duraram meses. Certo dia depois de sua partida, desenhei num vagão abandonado
um coração e nele escrevi nossos nomes com cores rubras, as quais, com o passar
dos anos não resistiram às intempéries do tempo, se esvaíram ao espaço como se
esvaíram a dor e a saudade de sua eterna ausência. Ela nunca mais retornou
àquela estação e eu nunca mais a vi. Eu era adolescente que enxergava o
amor nas mínimas coisas e anotava tudo num caderno repleto de frases poéticas, mas
naqueles dias de intenso romantismo pasmem amigos! Esqueci de enxergar o óbvio:
anotar o sobrenome e nem o endereço dela. Anos se passaram e à medida que
ia andando pela mesma estrada, como por encanto, via surgir por detrás da
folhas das árvores o seu rosto angelical e olhar lânguidos que naquele final de
tarde eram compartilhados por resquícios raios do sol. A saudade era tanta que
abria o meu peito e o enchia de ar só para que eu sentisse os perfumes das
flores trazidas pelo vento, e quiçá, de alguns resquícios do perfume de Joyce,
talvez ainda impregnados nos campos verdejantes que se esparramavam pelos
terrenos férteis.
Observava
o movimento dos pássaros, sentia o sol queimar o rosto, mas naquele final de
tarde, me deliciava quando o via o sol descer soberbo no horizonte emitindo
raios alaranjados. Sentia uma sensação inigualável. O rosto dela era parte
integrante do cenário, que de tão perfeito, parecia onírico. Mas, voltando ao
tempo de adolescência, ao caminhar por aquela “estrada da vida”, não soube
escolher o caminho certo e ás vezes, andava a esmo, sem lenço para enxugar as
lágrimas ou um documento qualquer que pudesse identificar-me ao recebê-la na
última estação. Talvez, quisesse enxergar certas coisas de uma forma, não como
hoje, que, calejado, em face da labuta cotidiana, passei a ver de outra, não
porque tudo tenha mudado, mas porque a minha forma de interpretá-la
mudou.
A “estrada
da vida” se esticou assim como o tempo que passou sobre os nossos rostos
deixando-os carcomidos. A estrada que percorremos fez-nos deixar
para trás muito choro sufocado e muita injustiça a ser vencida. Mas, seja qual
for à estrada, se de chão ou de ferro, nem sabemos em que parte dela a dor deve
ser curada, sabemos que ela nos conduzirá ao mesmo lugar e trafegar ou
equilibrar sobre ela é o que se questiona. Podemos até passar rapidamente
ou devagar sobre ela, não importando a velocidade que imprimimos. Podemos
causar impactos, sentimentos vários nas pessoas ou em nós mesmos. Podemos
encontrar durante nossa caminhada dias nebulosos, ventanias, sol extremamente
quente, noites e dias frios, pedras, espinhos e até pessoas que passam por esta
mesma estrada, umas com semblantes rancorosos, outras distraídas, venenosas,
falsas, egoístas e outras cheias de amor, mas, todas sabendo, que no final da
“estrada” todos terão o mesmo destino: rostos carcomidos pelas intempéries do
tempo, para não dizer que chegaram à velhice e como final, a morte, para uns, o
descanso eterno, para outros, é vida nova no paraíso, mas, para mim, é somente
a certeza de ter conseguido chegar ao fim da estrada ileso e pagando menos
pedágios.
Tem dia
que sentamos na beira da estrada e sentimos o vento levar nossos pensamentos
sem pedir licença. Tem dia que pegamos pétalas de rosas à sua beira e elas nada
exalam. Tem dia que vemos passar por ela marés de incertezas e não reagimos.
Tem dia que tentamos encontrar outra estrada e sonhar um sonho que almejamos
sonhar, mas não conseguimos. Tem dia na estrada que a noite é pesada demais
mesmo sem termos pesadelos. Tem dia que nos lembramos do passado sem
assombros, mas, tem dia que a vemos cheios de escombros. Tem dia que perdemos
alguém na “estrada” ou na última “estação” que muitas vezes nem dávamos o
devido o valor. Tem dia... Ah, se tem!
Caminhando
à beira da estrada e com o pensamento absorto, percebi que o meu passado é a
estrada que percorri durante toda a minha existência e este aspecto não devo
esquecer. Foi através desta caminhada longa, entre erros e acertos, com
realização profissional ou não, é que cheguei onde estou ou encontrei a
felicidade de haver ao longo dela encontrado o amor, a paz, fazer grandes
amigos e realizar alguns sonhos, talvez pagando pesados pedágios, tributo que a
vida nos impõe e nos dificulta alcançar outros sonhos, objetivos e ou
mesmo chegar à última estação.
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