Escutar
de tudo na vida a gente já escutou e ainda continuamos escutando. Pessoas usam
os meios de comunicação para dizer meias "verdades" ou inteiras
mentiras com a mesma desenvoltura. Por mais que prestemos atenção na fala ou
textos escritos geralmente não sabemos quem é que está falando sério. Neste
mundo real as verdades são pedras preciosas entre nós, então, temos que
observar o semblante do falante, aguçar o ouvido, prestar bastante atenção e
tentar discernir o porquê e aonde o autor do texto quer chegar. Certo dia um
poeta amigo me contou uma história que me deixou boquiaberto, e quanto a esse
causo contado por ele quero cada um que tire as suas próprias conclusões...
Como comprei um detector de mentiras no Paraguai acabei me tornando um caçador,
por isso, particularmente, acho que o causo contado por ele é interessante, bem
rimado, poético, mas pode ser uma grande mentira, no entanto, vamos ao
ocorrido.
Certo dia, como de costume estava sempre no mesmo lugar e
desta vez era mais um causo que
ele contava de um caso ocorrido por acaso num final de tarde, quando ocorreu um
belo ocaso no Vale dos Ipês. Disse ele que estava deitado numa rede manuseando
seu laptop e de vez em quando voltava seus os olhos para o ocaso. Conversa vai,
conversa vem, num repente, ouviu alguém que estava numa rede ao lado, contar um
causo de uma mulher que teve um caso amoroso com um viajante que passou por
aquela região por acaso. O caso podia ter acontecido com ou sem o ocaso, como
também, com qualquer pessoa, mesmo considerando a impossibilidade do sol se pôr
no horizonte, de circunstâncias que não precedesse à noite poente ou apenas uma
aventura amorosa, desconcertante, indecente. Por acaso, disse-lhe que a mulher
veio da região fria do ártico e o jovem viajante do quente oriente. Quando
contava o causo parecia estar esperando o aparecimento de um crepúsculo como
aquele que outrora tinha apreciado no Antártico e de outros causos amorosos
pensados por ele premeditadamente.
Eu, um
simples cronista, nunca tinha ouvido em falar do caso, mas, com um sorriso
sarcástico aceitei ele continuar contando: Caro amigo seja como eu, minta, e se
puder invente. Inclua qualquer fato no seu causo e não será mero acidente,
mesmo se não conseguir ver o sol se pôr no oriente, ou o nascer da lua, no
mesmo instante, no ocidente, mesmo assim, minta, invente. O causo do caso que
eu ouvi foi por acaso e aconteceu diante de um lindo ocaso. Pode ser que a
história não seja verdade e ser apenas uma estória. O causo sempre precede à
noite e aí menos mal porque da minha rede podia enxergar o ponto cardeal. Você
sabe dependendo do que a natureza nos oferece o ocaso pode ocorrer tanto no
ocidente, no oeste, leste ou no poente, e se no seu inverso não existir pontos
cardeais, invente. O contrário do ocaso é a linda alvorada, e ela nos traz a
manhã, linda e incandescente, e com ela vai a nossa majestosa madrugada. O
causo acontecido durante o ocaso pode significar decadência, fim ou um período
que antecede esse fim, ou fim de um romance, ocorrido em Berlin ou na pequena
Bom Jardim. O conto ou queda de algo importante é para nós, a indicação de um
norte, além de nos mostrar que ele é sinônimo de ruína ou falta de sorte. Mas,
antes que ele finalizasse o causo, recolhi minha rede e desviei minha visão do
ocaso e procurei esquecer aquele caso. Deixei de ouvir outros causos contados
por aquele poeta que falava de lindas mulheres e do viajante vendedor de vasos,
e nada mais é do que causos de casos amorosos ocorridos lá por acaso.
Outro
causo segundo assistiu o poeta, antes do ocaso, ele e seu tio montavam barraca
à beira do lago em ponto estratégico no Vale dos Ipês, pois de lá costumavam
ver cenas amorosas, anotavam tudo e prontas para se tornaram mais um causo. E
não era por acaso que anotava em seu laptop as cenas inusitadas e o encanto que
circundava aquele pedaço de chão. O local não podia ser vulnerável, pois era
perigoso e poderiam ter surpresas desagradáveis, principalmente caso errassem
na estratégia de bisbilhotar cenas alheias. Como ele e o tio eram caçadores de
primeira viagem, por acaso nada lhe foram informados e nenhuma tática foi
adotada antes do ocaso, deixando por conta do tio, o mais experiente, a
incumbência da escolha do local mais apropriado para descrever as cenas que
iria fazer parte de mais um romance ou apenas mais um causo a ser contado. E
não era por acaso que o tio tinha a mania de inventar coisas, contar causos e
lorotas, pois sabia que essa era a única maneira de informar ao poeta sobre as
cenas que via à beira do lago. E também não foi por acaso que escolheu do outro
lado uma árvore bem alta, cheia de galhos e teoricamente segura para ser o
olheiro do poeta. E foi assim que, para contar mais um causo de amor, armaram o
acampamento entre as forquilhas de uma torta e frondosa árvore milenar. O ocaso
veio e a noite correu lenta, vez por outra o vento assobiava assustador, as
folhas das árvores balançavam soltando sons estranhos e caiam sobre o capim
seco que circundava o lago. O silêncio entre os dois era total, não se ouviu
qualquer palavra; a respiração, antes ofegante, passou a quase nula, tal a
preocupação em não fazerem barulho para não assustar o casal de namorados que
se silenciaram dentro de uma pequena barraca iluminada apenas por um fraco
lampião a gás.
Passou-se
o ocaso e meu amigo poeta, caçador de primeiríssima viagem, ao ver gestos de um
vai vem erótico que se refletia de dentro da barraca, estabanado que era, pulou
da árvore, pegou um caderninho, sua máquina fotográfica e saiu correndo feito
maluco em direção a ela, atravessando o lago num nado sem sincronismo e sem
olhar para trás. A ansiedade era tanta que quando chegou perto da barraca,
vendo que estava molhado e trêmulo, pisou em galhos secos e repentinamente
parou. O casal, ao ouvir o barulho, olhou por uma pequena brecha na lona e
perguntou: Que você quer cara? Ele, na maior cara-de-pau disse que estava
correndo de uma onça, e como não a acertou, pulou da árvore e saiu correndo
atrás dela até pular no lago.
É
história de poeta ou de um poeta caçador de história. Ainda bem que não sou
caçador de onças, apenas de mentiras e aquele causo, como os outros, foi
demais!... Esse negócio de mentira não é comigo, mesmo sabendo que ao poeta ou
romancista tudo pode. Agora, sou eu que vou contar um pequeno causo: Certa vez
fui pescar e o motor do barco caiu lá no meio rio. Procurei incansavelmente,
horas e horas até aparecer o ocaso... Não sei se foi sorte ou por um acaso,
três dias depois o encontrei e minha maior surpresa foi verificar que o motor
ainda estava funcionando! É verdade Té! Esses e outros causos são apenas
histórias de caçador, às vezes medroso, às vezes valente, às vezes verdadeiro,
às vezes mentiroso, no entanto, mais uma vez, ficou provado que mentira tem
pernas curtas e, se não fosse o lago esse meu amigo poeta ainda estaria
correndo ou sido devorado pela onça e eu, me vangloriando da potência do motor
de meu barco.
0 comentários:
Postar um comentário