Tem dia
que tudo acontece de forma inesperada. A gente vai até a janela e o céu parece
menos azul, o sol teima em queimar o rosto das pessoas, enquanto os pássaros
passam emudecidos, alçam vôos rasantes e desaparecem no meio da mata. O vento
passa efêmero sem trazer nenhum cheiro de lá. Deixo a janela e ligo o
computador. Como num passe de mágica aparecem na telinha do monitor lindas
imagens acompanhadas de várias mensagens acalentadoras: montanhas, lagos, rios,
cachoeiras, castelos medievais construídos no topo das colinas, adornados de
pedras preciosas; depois, fotos pitorescas de várias partes do mundo que mais
pareciam obra de arte. Em algumas imagens, sem clareza, pareciam ter mais de um
sentido, pessoas sentadas num banco, ao lado de um banco, enquanto outras
passeavam alegres, com olhares enigmáticos, cheias de dúvidas e passos
imprecisos. Casais a poucos metros dali, de forma estranha, trocavam beijos à
beira do lago, enquanto os canoeiros nem se importavam com os “trejeitos” deles
e continuavam remando, apreciando o pôr do sol. Pássaros, aos montões,
continuavam passando rasantes, numa cantoria sintonizada, como se estivesse sob
a batuta do maestro Frederick Chopin.
Fecham-se
aquelas cenas, clico noutro link e outras se abrem. Imagens começaram a
aparecer novamente, mas, desta vez, contrastando com as anteriores, então
percebi que nelas existiam outros protagonistas, um pouco sem clareza,
encenando num outro palco da vida. Pessoas estiradas nas calçadas, crianças
esqueléticas, desnutridas, sujas, maltrapilhas, bêbados, viciados em drogas,
jovens se agredindo, disputando um cachimbo recheado de crack. Imagens de
meninos e meninas de rua peregrinando, sem rumo, pés descalços, em busca de um
lugar melhor na sociedade. Crianças e adolescentes em casas abandonadas, em
terrenos baldios, debaixo de pontes onde fazem delas suas moradias ou para se
protegerem do sol escaldante e do frio da noite, enquanto outras se deparam com
a violência das ruas e muitas vezes quedam-se diante dos olhares sisudos da lei
e são presas, maltratadas e ao serem julgadas pela justiça dos homens não têm
ninguém que possa defendê-las, compreendê-las e ampará-las de verdade.
Elas ou
eles são como todos nós somos apenas passageiros de um trem qualquer, que segue
num comboio cheio de vaidades, enquanto nosso subconsciente vai traçando uma
visão idílica de um mundo que muitas vezes é cheio de desventura. Ao ver essas
pessoas amontoadas nas calçadas, debaixo das marquises, cobertas apenas pelo
manto negro da noite, cheirando cola para enganar a fome, sem perspectivas de
vida, me fazem pensar como passageiro desse trem da agonia, qual será o destino
de cada um, então, só me resta aguardar a próxima estação e imaginar, se ao
desembarcar, haverá recepção com bandas marciais, bandeiras a acenar e também
se, na última estação, todos os sonhos deles e nossos irão se concretizar, ou
talvez, possamos perceber que não haverá estação como também não haverá lugar a
chegar.
Precisamos
repensar e refletir sobre tudo o que vem acontecendo com o nosso País, com
pessoa humana e parar de contar os quilômetros percorridos de uma estação a
outra e apreciar a viagem que muitas vezes fantasiamos em nosso subconsciente e
não conseguimos enxergar que as coisas da vida são simples, cheia de essência e
o detalhe é não perdê-la, para depois, termos a certeza que a última estação
chegará, trazendo as responsabilidades em relação ao futuro e os pesos que a
vida pode trazer. E quando forem abertas novamente as cortinas do tempo
possamos constatar que estamos assistindo, diariamente, cenas de belezas de um
lado, horripilantes de outro, ora sem clareza, ora duvidosas, ora com mais de
um sentido, que nada mais é do que cenas extraídas de um mundo surreal,
enigmático e às vezes, ambíguo.
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