Diariamente vemos
cenas chocantes na televisão. O apresentador, sem pedir licença, entre em
nossos lares e vai mostrando cenas de criminalidade que infestam nossas
cidades. Debaixo das marquises ou em bancos de praças pouco iluminadas, jovens
esquálidos, maltrapilhos, sem rosto, deitam sobre as calçadas, parecendo
espectros animalescos possuídos pelo demônio. São cenas horripilantes! Em
becos, ou numa rua ou avenida, mais perecem protagonistas de filmes de ficção e
nesse palco de horror, uns se arrastam ou cambaleiam pelas calçadas como se
fossem répteis, e dominados pelo vício, não respeitam nada que vêem pela
frente. Sob o uso da maconha destroem lares, famílias, roubam e até matam seus
entes queridos para adquirir a maldita droga. Esses personagens que perambulam
pelas calçadas, abandonados pelo setor público, e até pela própria família, não
conseguem viver sem ela, perambulam pelas ruas sem rumo certo, como fossem
esqueletos humanos, sujos, maltrapilhos e em seus rostos vemos movimentar
apenas um infinito de esgares, como se a câmara do olhar estivesse fora de foco
para mostrá-los nas tevês, como meros seres anônimos, mortos-vivos,
pesos-mortos, e às vezes cobertos por míseros cobertores de lã, ficam
encolhidos nos cimentos frios de uma calçada qualquer. As imagens focadas pela
TV não mostram esses infelizes colocando um pedaço de pão ou um copo de leite
na boca, mas, cachimbos infectos e até latinhas de refrigerantes que eles
adaptam para “fumar” maconha. Essa maldita planta, que não cria, não dá,
somente tira e mata!
Lembro-me de um
garoto extremamente alegre, que mesmo nos campos de futebol de chão batido,
fazia a bola rolar com maestria, cadenciava as jogadas para municiar os
companheiros e possuía um chute desconcertante, certeiro. Era o artilheiro do
time. Menino humilde e mesmo com os pés descalços, sonhava um dia calçar
chuteiras coloridas e se tornar um Cristiano Ronaldo, um Lionel Messi, um
Neymar... Empreitada difícil considerando esta comparação porque ele não teve
berço e nem fora preparado pela sociedade como foram esses atletas e tantos
outros; nunca lhe foi exigido assiduidade na escola ou mesmo recebido apoio da
família e uma educação religiosa. Ninguém o acompanhava em suas perambulações
pelos campinhos poeirentos que se espalhavam pelas periferias da cidade.
Faltava-lha o amor, diálogo. Em muitas daquelas praças esportivas as drogas
“rolavam” livres e nos becos e lotes baldios garotos e garotas se prostituíam e
o pior, as drogas se espalhavam e junto com elas, as mais letais, mais baratas,
piores que a naftalina das baratas cascudas, piores do que tomar água suja no
leito das calçadas de via pública. Ela se multiplica e transformam esses
incautos, não mais apenas pobres, mas todos somente em lixos urbanos,
homens-descartáveis, não-recicláveis. Num País como o nosso, onde certas coisas
parecem não ter qualquer importância: a dignidade é apenas uma delas. É um
confronto difícil e violento sair todo dia às ruas, pior ainda quando se vive
numa grande cidade, como a nossa, e pouco se pode fazer. Você dá de cara com
crianças vivazes obrigadas a mendigar a pedido dos próprios pais alcoólatras ou
viciados. Dá de cara com gente velha, com fome, doente, com feridas pelo corpo,
alguns carregando faixas de publicidade no pescoço, outras mutiladas advindas de
uma guerra quixotesca. Damos de cara com pais perversos, padrastos e madrastas,
violentas e criminosas e quando não damos de frente com elas, a televisão
mostra. Nas esquinas, nas pontes e postes, dentro de caixas, atrás de muros,
junto com os ratos de esgoto, ficam ali jogados os pacotes de lixo-gente.
Muitos deles aprendem e sobrevivem com seus vira-latas como se estivessem sendo
empurrados pela mão invisível do destino.
Mas agora vamos
voltar falar do crack ou quiçá, da maconha também. Essas drogas malditas que,
por ser estimulante, ocasiona dependência física e, posteriormente, a morte por
sua terrível ação sobre o sistema nervoso central que gera, em razão disso, a
aceleração dos batimentos cardíacos, aumento da pressão arterial, dilatação das
pupilas, suor intenso, tremores, excitação, maior aptidão física e mental. Os
efeitos psicológicos são a euforia, a sensação de poder e o aumento da
auto-estima. E ela foi o grande mal daquele garoto craque de bola que passou a
ser usuário de droga; que não conseguiu ver a vida florescer e retirar dela os
galhos podres para poder, pelos menos, conseguir driblar a morte, mas
infelizmente não conseguiu. Num entardecer foi visto agonizando num beco escuro
sob o efeito da droga, só que, naquele dia, além de uma overdose, recebera um
tiro no peito, porque simplesmente não conseguiu pagar uma dívida inerente a
umas pequenas “pedras” de crack que comprara de um traficante.
Ao ver aquela cena
pela TV questionei: O que as autoridades constituídas têm que fazer? E sem
pensar, respondia com ar de revolta: Em primeiro plano, a vontade política em
resolver tal situação, não obstante constatemos que, enquanto existir no
Congresso Nacional os conchavos, as negociatas que fazem surgir as famigeradas
benesses de emprego para seus apaziguados, um dinheiro a mais no orçamento; faz
surgir os corruptos e corruptores que se perpetuam com o auxílio poder
Executivo e legislativo. Enquanto existir a política esperta e populista que
está aumentando a preguiça da população carente oferecendo bolsas família, tudo
isso em nome de um capitalismo barato, de fachada, que gasta milhões em
propaganda para fazer você acreditar naquilo que não vê. Enquanto não existir
uma base mínima de um trabalho coordenado, completo, que una saúde pública,
assistência social, caridade, segurança e perspectiva, inclusive emocional, de
nada adiantará o esforço daqueles que querem ver o Brasil sem crise. Em segundo
plano, neste momento cruciante, todos precisam apoiar todos; todos por qualquer
um. A liberdade individual, a possibilidade de escolha, existe, mas ambas têm,
sim, limites.
Não adianta pegar
esses infelizes e levá-los a abrigos, dar-lhes banho, lavar suas roupas,
secá-las, botar para coar, enfiar comida em suas bocas, porque eles preferem as
ruas. Dar entrevistas bombásticas, com o fito emocional, também de nada
adiantará, pois em minutos depois, em abstinência, eles voltam. Não adianta a
sociedade empurrá-los de lá para cá: agora estão cada vez mais perto de nós,
onde são mais danosos que pode soar como um alerta: os traficantes estão
chegando aos montões em qualquer parte do País e alimentando os usuários de
crack e cocaína, principalmente em Goiânia. Vemos na televisão que esses
usuários e traficantes estão transformando o Brasil num teatro de horror, cujos
personagens parecem ter saído de filmes de terror protagonizando cenas
inenarráveis, lotando de infelizes os gramados da vida mundana. Se a sociedade
organizada não tomar providências urgentes; se os olhos por mais embaçados que
forem, marejados ou míopes não verem, se seus ouvidos não escutar o clamor que
vem das ruas; se todos os responsáveis continuarem empurrando com a barriga,
poderá, de um lado, esta dependência química se proliferar de uma maneira
assustadora, incontrolável e fazer fortunas para muitos, entretanto, do outro
lado, destruir vidas, famílias e aumentar os “lixos” humanos.
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