Mãe Cleusa e as Bolhas de sabão

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Triburo a Gari Negro Jobs

Depois de um mês em que uma pessoa querida partiu (minha tia-madrinha) para outra dimensão e nesta semana ver o meu cavalo pangaré estirado inerte sobre a relva molhada só me resta palavras frias que colidem com o medo repentino de ter o que não se pode amar. Sentado no mourão da porteira, ouço uma canção triste, talvez uma espécie de música a delinear traços de meus relatos, compostos de sentimentos incompletos e histórias inacabadas. A vida sem trilhos e sem chão se desmorona ante os pequenos milagres cotidianos. Leva-nos para um lugar desconhecido, todavia, ao tempo que é sombrio, nossos olhos ainda brilham e saltam e diante da bondade latente e dos encantos escondidos na mãe, na mulher inteligente e misteriosa, que simplesmente os escribas, romancistas e poetas chamam de Clara Dawn.

Se tudo muda o tempo todo, para ela nada muda, continua a mesma, sempre com um sorriso amigo, sem maldade e sereno. Saudade deve sentir em demasia e é certo que o seu pensamento vai ao infinito e volta levando e trazendo relatos ordinários confeccionados por essa saudade, pelo sentimento e pelo amor inconteste que sente pelos filhos. As imagens trazidas explodem em um mundo governado por anti-heróis e sua cabeça de mãe atravessa noites intermináveis lendo um romance ou elaborando textos para o Diário da Manhã, tudo sob o som suave de melodias inesquecíveis. Torturantes horas em que busca o seu sono perdido. Entre sonhos reprisados levanta e vai até a escrivaninha rabiscar nomes e palavras soltas. Liga a TV e vê alguém cantar uma canção romântica que embala o seu sorriso triste e a ampara do medo que circunda o teatro da vida. Deleita-se no sofá no exato momento de seus delírios e subtrações não resolvidas. A matemática da vida e seus constantes mistérios; o silêncio absorto em seus lábios e o semblante pensativo, completam aquele pequeno universo que a rodeia. Palavras que queria dizer no passado e frases incompletas não ditas no presente mostram-lhe em um mosaico de acontecimentos da fria realidade escondida em seus olhos castanhos ou furta-cores. Deixa suas fantasias no travesseiro quando é despertada pelo som estridente de uma freada de carro, de um latido de cão, de uma batida no portão, de um grito de gente na escuridão ou de um despertador, que certamente, sempre lhe roubou os melhores momentos de um sonho, mas, tudo isso, nunca lhe tiraram a esperança em um mundo melhor, no apoio da família, dos amigos e a fé inconteste em Jesus de Nazaré.

Os sonhos voaram como bolhas de sabão e estas subiam e recebiam em seu corpo pequeno e redondo, cintilantes raios de sol e eram levadas pelo vento enquanto esperava o tempo passar. Esperava para quê? Já era adulta – e fria como a todos os amadurecidos ou apenas reflexos que recriava o que tinha sido até então. Nuvens cobriam o céu em que o sol era apenas coadjuvante e lutava firmemente para raiar e iluminar a terra naquele final de tarde. De madrugada, antes de receber as flechadas solares, lembrou-se das bolhas de sabão que adoraria ser para poder flutuar no espaço e desafiar a gravidade e jamais pensar em um mundo incógnito que continuava girando, sem freio, sem pressa, sem sonho, sem expectativa e alegrias de alguns, geralmente camufladas em sorrisos irônicos. Suas palavras sábias ditas ou não ditas durante sua existência e suas expectativas quanto ao futuro certo ou incerto, assim como as bolhas de sabão que levaram seus sonhos repaginados pelo travesseiro celeste, as quais, certamente, teriam destino certo: as mãos de Deus. Não obstante se encontrar indecisa sobre em que parte do universo estouraria a sua bolha de sabão, estava sempre confiante, feliz e certa de que viriam dias melhores, mas, também consciente que nesses mesmos sonhos poderiam se repetiriam as mesmas adversidades, os mesmos temores e acalantos antes do sol nascer.
VANDERLAN DOMINGOS DE SOUZA.  É advogado e escritor – Membro da União Brasileira dos Escritores.   E-mail: vdelon@hotmail.com Autor dos Livros: Uma Pedra no Caminho; O Mistério do Morro do Além; e Espelho das Águas.

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