A última estação.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Adolescente, saía caminhando sem rumo pela estrada aguçando os ouvidos para ouvir o canto harmonioso dos pássaros e o apito inebriante da locomotiva avisando de sua chegada na última estação. Em alguns momentos parava no acostamento para escutar o barulho cadenciado sobre os trilhos e quando ouvia, meu coração acelerava esperançoso em saber que aquela linda menina já estaria lá à minha espera. Quando a conheci pela primeira vez naquela estação, tivemos apenas uma troca de olhar e foi amor a primeira vista. Começamos a ensaiar um romance que duraram meses. Certo dia depois de sua partida, desenhei num vagão abandonado um coração e nele escrevi nossos nomes com cores rubras, as quais, com o passar dos anos não resistiram às intempéries do tempo, se esvaíram ao espaço como se esvaíram a dor e a saudade de sua eterna ausência. Ela nunca mais retornou àquela estação e eu nunca mais a vi.  Eu era adolescente que enxergava o amor nas mínimas coisas e anotava tudo num caderno repleto de frases poéticas, mas naqueles dias de intenso romantismo pasmem amigos! Esqueci de enxergar o óbvio: anotar o sobrenome e nem o endereço dela. Anos se passaram e à medida que ia andando pela mesma estrada, como por encanto, via surgir por detrás da folhas das árvores o seu rosto angelical e olhar lânguidos que naquele final de tarde eram compartilhados por resquícios raios do sol. A saudade era tanta que abria o meu peito e o enchia de ar só para que eu sentisse os perfumes das flores trazidas pelo vento, e quiçá, de alguns resquícios do perfume de Joyce, talvez ainda impregnados nos campos verdejantes que se esparramavam pelos terrenos férteis. 

Observava o movimento dos pássaros, sentia o sol queimar o rosto, mas naquele final de tarde, me deliciava quando o via o sol descer soberbo no horizonte emitindo raios alaranjados. Sentia uma sensação inigualável. O rosto dela era parte integrante do cenário, que de tão perfeito, parecia onírico. Mas, voltando ao tempo de adolescência, ao caminhar por aquela “estrada da vida”, não soube escolher o caminho certo e ás vezes, andava a esmo, sem lenço para enxugar as lágrimas ou um documento qualquer que pudesse identificar-me ao recebê-la na última estação. Talvez, quisesse enxergar certas coisas de uma forma, não como hoje, que, calejado, em face da labuta cotidiana, passei a ver de outra, não porque tudo tenha mudado, mas porque a minha forma de interpretá-la mudou. 

A “estrada da vida” se esticou assim como o tempo que passou sobre os nossos rostos deixando-os  carcomidos.  A estrada que percorremos fez-nos deixar para trás muito choro sufocado e muita injustiça a ser vencida. Mas, seja qual for à estrada, se de chão ou de ferro, nem sabemos em que parte dela a dor deve ser curada, sabemos que ela nos conduzirá ao mesmo lugar e trafegar ou equilibrar sobre ela é o que se  questiona. Podemos até passar rapidamente ou devagar sobre ela, não importando a velocidade que imprimimos. Podemos causar impactos, sentimentos vários nas pessoas ou em nós mesmos. Podemos encontrar durante nossa caminhada dias nebulosos, ventanias, sol extremamente quente, noites e dias frios, pedras, espinhos e até pessoas que passam por esta mesma estrada, umas com semblantes rancorosos, outras distraídas, venenosas, falsas, egoístas e outras cheias de amor, mas, todas sabendo, que no final da “estrada” todos terão o mesmo destino: rostos carcomidos pelas intempéries do tempo, para não dizer que chegaram à velhice e como final, a morte, para uns, o descanso eterno, para outros, é vida nova no paraíso, mas, para mim, é somente a certeza de ter conseguido chegar ao fim da estrada ileso e pagando menos pedágios.

Tem dia que sentamos na beira da estrada e sentimos o vento levar nossos pensamentos sem pedir licença. Tem dia que pegamos pétalas de rosas à sua beira e elas nada exalam. Tem dia que vemos passar por ela marés de incertezas e não reagimos. Tem dia que tentamos encontrar outra estrada e sonhar um sonho que almejamos sonhar, mas não conseguimos. Tem dia na estrada que a noite é pesada demais mesmo sem  termos pesadelos. Tem dia que nos lembramos do passado sem assombros, mas, tem dia que a vemos cheios de escombros. Tem dia que perdemos alguém na “estrada” ou na última “estação” que muitas vezes nem dávamos o devido o valor. Tem dia... Ah, se tem!

Caminhando à beira da estrada e com o pensamento absorto, percebi que o meu passado é a estrada que percorri durante toda a minha existência e este aspecto não devo esquecer. Foi através desta caminhada longa, entre erros e acertos, com realização profissional ou não, é que cheguei onde estou ou encontrei a  felicidade de haver ao longo dela encontrado o amor, a paz, fazer grandes amigos e realizar alguns sonhos, talvez pagando pesados pedágios, tributo que a vida nos impõe e nos dificulta  alcançar outros sonhos, objetivos e ou mesmo chegar à última estação.



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