Certo
dia quando ouvia Milton Nascimento tentei entender o significado dessa frase.
Cheguei quase perto da compreensão quando um dia me senti no lugar errado, na
hora errada, perto de uma experiência incomum, de como viver neste mundo, de
querer morar em outra matéria ou dimensão. Coisa de doido não? Viver
o amor e o seu não pertencimento, de não querer morar no meu interior e ir
morar no interior de outra matéria, logo eu que já me considerava caçador de
mim mesmo, querer viver de forma desconhecida. Parecia loucura mesmo, talvez
houvesse um fundo de verdade, mas eu gostava e gosto demais do meu habitat, que
o transformo num recanto de devaneios e loucuras poéticas; gosto da disposição
dos móveis, da pequena estante abarrotada de livros, do meu computador que me
leva a viajar pelo mundo; vou aos mais longínquos rincões e volto como num
passe de mágica. Ah, como esquecer o cheiro que vem da cozinha que fica bem ao
lado, que traz com o auxílio do vento, o tempero mágico de Eva.
É meu santuário... Recanto que realmente me faz
viajar pelo mundo da imaginação e chegar até você; recanto que me faz adivinhar
qual de vós intervém por mim, quem irá me ouvir, ler meus textos, às vezes sem
sentido; quem irá me proteger de mim e fortalecer o amor e a eterna falta que
faz quando empunharmos a arma do destino e partimos para uma grande caçada e
acabamos caçando a nós mesmos. Às vezes sentimos não ter ninguém do outro lado
ou alguém por tempo determinado, já que somos finitos, que mudamos de idéia sem
pestanejar, que somos imprevisíveis, imprevistos, inconsequentes, e por onde
passamos tem-se curvas e nem notamos, porque a reta não nos seduz. Gostamos do
perigo e fazer curvas mirabolantes traz uma sensação intensa, incompreensível a
nós seres humanos. O tempo diz que tenho que seguir com vocês nessa grande
caçada e por mais que a racionalidade me finque no chão; quero que seja sempre
assim e que possamos ir além do finito dos nossos corpos, seja nesta dimensão
ou não. Exagero, à parte, mas não enfeito, não faço zoom do meu amor, da minha
amizade sincera e nem olho vocês de longe, porque quero todos por perto. Pode
parecer devastador, mas nada me destrói e nem me apequeno amar vocês.
Materialmente quero morar no coração de todos sem ser uma mera peça; quero me
vestir de vocês sem me despir do que sou...
Quando
estou escrevendo, paro, penso reflito e às vezes fecho os olhos, puxo a
respiração, encho o peito de ar e procuro sentir a presença de quem já não está
mais por perto. Entes queridos, seres sublimes que já se foram para outra
dimensão. É um método que uso e me faz bem porque sei que recebo a “energia”
deles e as uso sempre quando o amor se transforma em saudade.
Os
grandes amores existem e sempre existirão. As grandes paixões existem e sempre
existirão. Eles simplesmente existem. E quem disser o contrário, mente. Eu
desejo que todos os seres humanos possam sentir o que eu um dia já senti.
Tempos idos foram minutos de entorpecimento juvenil, de uma inundação de
sentimentos que enlouquecem, de uma loucura toda que envolve a gente, trazendo
certo medo, uma confusão misteriosa que a gente viveu quando adolescente. Uma
paixão avassaladora que me fazia sentir vivo. Vivo e amando. Se amado não tinha
certeza. Mas, agora, dedilhando o teclado do computador vou amontoando letras
no monitor e querendo ser caçador de mim mesmo vou me embrenhando pela selva
que me envolve e que cresceu tanto que não mais consigo regar, apenas deixa-me
levar... As minhas mãos calejadas pelas labutas cotidianas e pele corroída
pelas intempéries do tempo, não encontram mais as dela.
Vazio, não sinto mais, pois a borracha do tempo se
encarregou de apagar. Nem existe a sensação de derrota e hoje tenho mais para
quem escrever as minhas defeituosas crônicas, a quem dedicar meus pensamentos,
a quem vai me acalmar quando a tristeza aparecer sem avisar. Eu não me sinto
sozinho. Por vezes nem me sinto, fico anestesiado, como estivesse viajando em
busca do impossível. O escritor vive em busca de si mesmo, mas é pertinente às
suas ideias e maluquices. Ilustra os textos com coisas reais e surreais, cria
sabores, faz até exalar aromas que extrai do improvável e transmiti imagens ao
associar as palavras e nesse afã, procura ser original, contorna algumas regras
impostas, como se elas fossem corredores imaginários, mas, notadamente, sem as
desrespeitar, mas nunca deixando de ir mais longe, mesmo sem usar as asas da
imaginação, alcançar o improvável. E quando as usas tem o poder de descrever o
mundo de uma forma sutil e consegue transformar o ordinário em extraordinário,
e nesse ínterim, sem necessidade de se afirmar como intelectual gera empatia e
faz com que todos vejam mundo de dentro para fora e depois de fora para dentro,
transformando-se todos em caçadores de si mesmos. Quando se escreve uma frase
bonita que toca a alma e o coração da gente, como fez Milton Nascimento em sua
canção “Eu, caçador de mim” que dizia:
“Por tanto amor, por tanta emoção, a vida me fez assim, doce ou atroz,
manso ou feroz...” e ao ouvir,
não há olhos que não se vertem em lágrimas e nem coração que deixe de bater
descompassado. Aí pergunto: Será que estamos vivos? Ainda que maldissessem a
sina e mazelas, jamais o escritor afogará suas crônicas na cachaça libertadora,
assim como não haverá outro perfume no seu corpo a não ser o cheiro do suor
produzido pelo espaço quente que o envolve. Viver é amar, um dia me explicaram
direitinho. Tempos idos, era apenas um sonhador inocente e acreditava. Só
inocentes e tolos crédulos aprendem isso, eu tive o azar de ser um deles. Hoje,
nem ouso reclamar, apenas agradecer a Deus pelo que sou.