Sentado à beira do mundo.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014





Você já imaginou sentar-se à beira do mundo e olhar o universo infindo, mas não encontrar lugar algum, nem uma meia-sombra do sol ou da lua ou poder descansar debaixo de uma árvore milenar plantada por um ser extraterrestre numa estrela qualquer. Ainda, poder suspirar as brisas que vagueiam pelo espaço sideral sem derramar seus aromas sutis, e ou, à meia-luz, se sentir iluminado pelo sol que, generosamente, insiste em permanecer girando e aquecer o frescor do dia que se esvai pela beirada de mundo.

E hoje, de frente para um universo que não sei discernir, restou-me aquecer da leveza do momento que de tão imenso o silêncio não quebrou por sons vindos de uma terra perdida, mas, felizmente, preenchido pelas batidas do meu coração e pela voz infantil de uma criança que brinca do outro lado do mundo. Meu coração começa a bater no ritmo suave de um mar sem pedras ou barrancos a impedir, mas se sente feliz. De meu posto privilegiado acompanho os pontos enfeitados do universo, talvez usando mais com o espírito do que com a consciência. Navego com os olhos e não vejo naves enfeitarem a paisagem estelar.  O meu mundo está aqui e não do outro lado e a cada olhar, procuro seguir para o meu porto seguro, ou nave, sei lá, mas sem pressa, sabendo que meu destino não se resume apenas deixar ou pegar passageiros errantes nas beiradas do mundo e sem estação espacial.

Tudo ao redor me traz paz. Toda a paisagem que vislumbro no universo me enche os olhos, o corpo treme, a alma se aquieta. Calmamente, espero minha nave, talvez, sem precisar para onde ir. Tão parte da paisagem quanto da encosta da beirada de meu mundo, sem precipício, e quem me olha de longe, me vê inerte, uma estátua há muito tempo ali colocada.  Tão imersa na perfeição do momento que ninguém repara outras, colocadas no atracadouro, que agora passam lentamente diante dos olhos perdidos na escuridão do próprio ser de cada cidadão. Elas se diferem, mas nem tanto. As silhuetas causam frisson e é dificultoso vê-las ali naquela beirada de mundo esperando pacientemente por suas naves espaciais. Começo a divagar sobre a vida que tenho levado na parte que me coube viver nesta terra nossa que devia ser de todos.   Dores eu sentiu e muitas. Vitórias, derrotas, decepções já passei e muitas, que talvez hoje seja desnecessário contabilizá-las. 

Aguardando minha nave estelar aceno delicadamente aos passageiros da agonia que por ali passa no afã de não interromper seus devaneios e suas esperanças de encontrar na última curva uma estação para que possam apascentar juízos finais. Cada passageiro deve ter a capacidade de se adaptar às circunstâncias, olhar para frente e emplacar o silêncio que se acumula na região recôndita do cérebro e evitar que os pensamentos sejam surpreendidos pela voz roufenha e arfante de um bruto qualquer. Parece não haver mais naves espaciais e tempo urge. Não há mais nada – com certeza tão profunda do que esperar é esperar, o inesperado, que às vezes amedronta. E assim, entendo que resta aos sobreviventes da beirada do mundo ir embora e levar com eles a esperança de uma vida melhor e depositá-las noutras beiradas de mundo.

Eu reagi rápido, corri atrás, mostrei aos comandantes da nave o meu tíquete. Tinha até dois e nem entendia o porquê, todos com o horário e rotas corretas, enquanto do outro lado, continuavam repetindo, zangados e tristes até de saberem que não mais passaria outras naves ou outro objeto qualquer. Observei, por mero acaso, que alguém, uma mulher esbelta, de olhos claros, cabelos ondulados, seguia para o mesmo destino que o meu e estava calma. Vejo-a no embarcadouro, sentada, com o olhar voltado para o infinito. Ela não parecia ouvir nenhum cântico, o som do vento ou a brisa acariciar o seu corpo e calada estava. Apenas esperava a sua nave, que era a minha. 

Deus, o arquiteto do universo providenciou para que a gente estivesse na mesma hora e no lugar certo: um, para receber ajuda; outro, para dá-la. Moral da história: No fundo sabemos que o mais afortunado foi aquele que aproveitou a oportunidade para ajudar. E eu o fiz oferecendo um dos meus tíquetes. Portanto, faça isso você também, pois da próxima vez talvez seja você que venha a precisar de algum desconhecido. Ah, então, saia do seu conforto e insista para que a pessoa espere pela sua nave, porque, amigo, sempre chegará o dia em que todos precisarão de ajuda, e não importa quanto tempo passemos sentado na beira de nosso mundinho, nem quanto peso carregaremos e quantos minutos havemos de precisar para apreciar um final de tarde. E podem ter a certeza de que ao final todos pegaremos a mesma nave e seguiremos a mesma rota ou teremos o mesmo destino.

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