Amparando
o queixo com as mãos olhava o horizonte poente e aguçava os olhos que naquele
instante eram a janela de minha alma que tentavam recuperar a imagem de
uma mulher guerreira, que fora levada pelo tempo, sem motivo, como se fosse
uma simples folha seca... Talvez, seja este o padrão diariamente imposto a elas,
mulheres da vida real, modernas, mas sem realeza, sem personal trainer, sem
personal dieter, que à noite, assim como eu, mesmo com os olhos embaçados, se
debruçam na janela da alma, sem nada a ouvir, sem expressar sorrisos, e se
sentem dominadas por um exército de gente que não as entendem e nem procuram
saber que também sonham. Quieto
naquele quadriculado nostálgico e nem um pouco lúdico, nem vi o tempo
passar quando os meus olhos voltaram a se inclinar sobre a janela da minha alma
e enxergarem a poucos metros dali árvores centenárias também debruçarem os
ramos, assim como, os cabelos daquela linda mulher em louras mechas e o sol e a
lua se porem e nascerem soberbos. Mesmo cansados, sei que somente queriam é que
eu vivesse uma existência efêmera, mas encantada... Eu procurava entender isso
e saber que um dia tudo iria extinguir-se, então, não nada mais me restaria. Todavia, era deslumbrante ver a
primavera se antecipar florindo jardins e os Ipês, cujas flores caíam e deixavam
o chão colorido, que minutos antes, tinha sido molhado por pequenas gotas de
chuva rapidamente secadas em face escaldante sol que já se despedia detrás da
selva de prédios.
Diante da
perda daquela imagem restou-me usar as asas da imaginação, sair voando e num
vôo alado, livre, sem atropelos, alcançar o infinito, onde, talvez, poderia me
distanciar da terra e alimentar os meus sonhos e os dela em outras dimensões. Mas,
a imagem se esvaiu no universo mórbido, não mais vista, nem através da janela
de minha alma, e aí, fui novamente acalentado por pequenas gotas de chuva que
se debatiam no vidro da janela e com o cantar de alguns pássaros que procuravam
desesperadamente o seu habitat. No céu da imaginação tentava buscar o amanhã
que poderia até ser um sonho de ontem e hoje, ser apenas uma fantasia de quem
sonha com o impossível, de quem vive intensamente e agita-se ao vento, voa fantasiosamente
em busca do seu próprio “eu” num universo, controverso, desconhecido, que nem
sabemos ter fim e lá, poder achar o amor e a paz, se é que ainda existem. Sabemos
que a
alma universal não pode realizar-se perfeitamente enquanto não afastarmos de
nós o véu da ilusão, ou enquanto perdurar o sentimento do “eu” e do “meu”. Assim, sem contabilizar as horas
mortas e diante daqueles respingos de chuva primaveril, senti a janela de minha
alma se fechar antes de trazer de volta aquela imagem, pois sabia que com a
presença dela, captaria emoção e motivos necessários para escrever um texto
plausível capaz de alimentar prazerosamente a mente do meu querido leitor. Mas,
enquanto isso não ocorria, as cortinas do tempo se fechavam com o pôr do
sol mostrando o lado obscuro do mundo que parecia descer pelos desfiladeiros da
insensatez. Inerte, deixei-me dominar pelas asas da imaginação que levaram
junto comigo, como poeira ao vento, os meus desejos,
aspirações e esperanças, onde, a cada dia, tento fazer um ensaio
dramático para uma última cartada no teatro da vida, para quem sabe, do outro
lado, alguém possa entender e discernir o porquê de tantas mazelas que vêm
ocorrendo em nosso País, assim como, na nossa sociedade e quiçá, também, conhecer
e entender minhas angústias e lamentações.
Empilhada
em cantos escuros de minha alma, a soberba reflexão incorreta sobre quem sou,
hão de entender possivelmente, pois, minhas abstrações se limitam a nada
definir com profundidade, no entanto, como aquela imagem que se esvaiu no
espaço celeste, eu, você, sabemos que amanhã tudo voltará à velha rotina: morte
e vida; encontros e desencontros, tempestades e calmarias; lua e sol. Vozes
sussurrando palavras doces e mentirosas que são impregnadas em nossos ouvidos
desacostumados com a realidade e padrões duros impostos por uma sociedade
consumista. Nesse interregno, o tempo dita suas regras que são acopladas pelos
pólos magnéticos que se chocam em um espaço sem gravidade.
Por fim, com os olhos da alma desconectados, deixo
de dedilhar o teclado do meu computador e vou embora para ficar fora do campo de
visões que me angustiam. Assim, opto por voar nas asas da imaginação para
resguardar apenas o que restou daquelas lembranças, como um sorriso angelical, uma
palavra de afeto, uma foto postada, um compartilhamento, uma mensagem amiga, um
comentário, um texto poético, onde se podia ler coisas importantes e regozijar
das belas palavras lá escritas. Mas o olhar que sabe captar essas palavras mesmo
escritas de forma hieroglíficas hão de acreditar que nele existe uma beleza
pronta ou esperando para ser lapidada... Enfim, o que mais me encanta no olhar
é que, o contrário da boca, eles nunca conseguem desmentir o coração e é
através daquela imagem
inesquecível captada através da janela de minha alma é que hei, doravante, de cristalizá-la
para sempre na minha retina.
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