Debruçado na janela da alma

domingo, 8 de setembro de 2013



Amparando o queixo com as mãos olhava o horizonte poente e aguçava os olhos que naquele instante eram a janela de minha alma que tentavam recuperar a  imagem de uma mulher guerreira, que fora levada pelo tempo, sem motivo, como se fosse uma simples folha seca... Talvez, seja este o padrão diariamente imposto a elas, mulheres da vida real, modernas, mas sem realeza, sem personal trainer, sem personal dieter, que à noite, assim como eu, mesmo com os olhos embaçados, se debruçam na janela da alma, sem nada a ouvir, sem expressar sorrisos, e se sentem dominadas por um exército de gente que não as entendem e nem procuram saber que também sonham. Quieto naquele quadriculado nostálgico e nem um pouco lúdico, nem vi o tempo passar quando os meus olhos voltaram a se inclinar sobre a janela da minha alma e enxergarem a poucos metros dali árvores centenárias também debruçarem os ramos, assim como, os cabelos daquela linda mulher em louras mechas e o sol e a lua se porem e nascerem soberbos. Mesmo cansados, sei que somente queriam é que eu vivesse uma existência efêmera, mas encantada... Eu procurava entender isso e saber que um dia tudo iria extinguir-se, então, não nada mais me restaria. Todavia, era deslumbrante ver a primavera se antecipar florindo jardins e os Ipês, cujas flores caíam e deixavam o chão colorido, que minutos antes, tinha sido molhado por pequenas gotas de chuva rapidamente secadas em face escaldante sol que já se despedia detrás da selva de prédios. 

Diante da perda daquela imagem restou-me usar as asas da imaginação, sair voando e num vôo alado, livre, sem atropelos, alcançar o infinito, onde, talvez, poderia me distanciar da terra e alimentar os meus sonhos e os dela em outras dimensões. Mas, a imagem se esvaiu no universo mórbido, não mais vista, nem através da janela de minha alma, e aí, fui novamente acalentado por pequenas gotas de chuva que se debatiam no vidro da janela e com o cantar de alguns pássaros que procuravam desesperadamente o seu habitat. No céu da imaginação tentava buscar o amanhã que poderia até ser um sonho de ontem e hoje, ser apenas uma fantasia de quem sonha com o impossível, de quem vive intensamente e agita-se ao vento, voa fantasiosamente em busca do seu próprio “eu” num universo, controverso, desconhecido, que nem sabemos ter fim e lá, poder achar o amor e a paz, se é que ainda existem. Sabemos que a alma universal não pode realizar-se perfeitamente enquanto não afastarmos de nós o véu da ilusão, ou enquanto perdurar o sentimento do “eu” e do “meu”. Assim, sem contabilizar as horas mortas e diante daqueles respingos de chuva primaveril, senti a janela de minha alma se fechar antes de trazer de volta aquela imagem, pois sabia que com a presença dela, captaria emoção e motivos necessários para escrever um texto plausível capaz de alimentar prazerosamente a mente do meu querido leitor. Mas, enquanto isso não ocorria, as cortinas do tempo se fechavam com o pôr do sol mostrando o lado obscuro do mundo que parecia descer pelos desfiladeiros da insensatez. Inerte, deixei-me dominar pelas asas da imaginação que levaram  junto comigo, como poeira ao vento, os  meus   desejos, aspirações e   esperanças, onde, a cada dia, tento fazer um ensaio dramático para uma última cartada no teatro da vida, para quem sabe, do outro lado, alguém possa entender e discernir o porquê de tantas mazelas que vêm ocorrendo em nosso País, assim como, na nossa sociedade e quiçá, também, conhecer e entender minhas angústias e lamentações. 

Empilhada em cantos escuros de minha alma, a soberba reflexão incorreta sobre quem sou, hão de entender possivelmente, pois, minhas abstrações se limitam a nada definir com profundidade, no entanto, como aquela imagem que se esvaiu no espaço celeste, eu, você, sabemos que amanhã tudo voltará à velha rotina: morte e vida; encontros e desencontros, tempestades e calmarias; lua e sol. Vozes sussurrando palavras doces e mentirosas que são impregnadas em nossos ouvidos desacostumados com a realidade e padrões duros impostos por uma sociedade consumista. Nesse interregno, o tempo dita suas regras que são acopladas pelos pólos magnéticos que se chocam em um espaço sem gravidade. 

Por fim, com os olhos da alma desconectados, deixo de dedilhar o teclado do meu computador e vou embora para ficar fora do campo de visões que me angustiam. Assim, opto por voar nas asas da imaginação para resguardar apenas o que restou daquelas lembranças, como um sorriso angelical, uma palavra de afeto, uma foto postada, um compartilhamento, uma mensagem amiga, um comentário, um texto poético, onde se podia ler coisas importantes e regozijar das belas palavras lá escritas. Mas o olhar que sabe captar essas palavras mesmo escritas de forma hieroglíficas hão de acreditar que nele existe uma beleza pronta ou esperando para ser lapidada... Enfim, o que mais me encanta no olhar é que, o contrário da boca, eles nunca conseguem desmentir o coração e é através daquela imagem inesquecível captada através da janela de minha alma é que hei, doravante, de cristalizá-la para sempre na minha retina.

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