À beira da estrada.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014




Adolescente, ele saía equilibrando sobre os trilhos da estrada de ferro e às vezes, colocava o ouvido sobre eles na esperança de escutar os passos de uma linda menina que morava a poucos quilômetros dali. Outras vezes, escutava o barulho do trem e o seu coração acelerava esperançoso de vê-la descer na única estação. Certo dia, num vagão abandonado, usando um pequeno pincel, desenhou um coração sobre a lataria enferrujada e dentro dele, escreveu seus nomes usando as cores rubras de um coração-menino, mas já ferido pelo tempo e que, com o passar dos anos os nomes lá impregnados, não resistiram às intempéries do tempo e se esvaíram como se esvaiu a dor e saudade de eterna ausência dela. Nunca mais a viu.  Ele era um adolescente que enxergava o amor nas mínimas coisas e anotava tudo num caderno recheado de frases poéticas, próprias de um sonhador.  À medida que ia andando sobre os trilhos,  abria o peito para receber o vento que enchia os pulmões de perfumes vindos das matas e das flores que se esparramavam pela estrada de ferro afora. 

Inquieto, observava o movimento dos pássaros, sentia o sol queimar o rosto e o seu peito nu, e ao entardecer, se deliciava quando o via o sol descer soberbo no horizonte emitindo raios alaranjados. Sentia uma sensação inigualável, inexplicável e algumas vezes, via o rosto angelical daquela menina-moça se refletir por entre as folhagens das árvores floridas retalhadas pelos raios solares naquelas encantadoras tardes de primavera. O seu sorriso era parte integrante do cenário, que de tão perfeito, parecia onírico. Mas, naquele tempo, ao caminhar pela “estrada da vida”, não soube escolher o caminho certo. Talvez, enxergava certas coisas de uma forma, não como hoje, que calejado em face da labuta cotidiana, passou a ver de outra, não porque tudo tenha mudado, mas porque a sua forma de interpretá-la mudou. 

A estrada de sua vida se esticou assim como o tempo que passou sobre o seu rosto deixando-o  carcomido.  A estrada que percorreu fez-lhe deixar para trás muito choro sufocado e muita injustiça a ser vencida. Mas, seja qual for à estrada, se de chão, asfaltada ou de ferro, nem sabia em que parte dela a dor devia ser curada, apenas que ela o conduziria ao mesmo lugar e trafegar ou equilibrar sobre ela era o que ele se  questionava. Pode até passar rapidamente ou devagar sobre ela, não importando a velocidade que imprimiria. Podia até causar impactos, sentimentos vários nas pessoas ou em nós mesmos. Podia encontrar durante sua caminhada dias nebulosos, ventanias, sol extremamente quente, noites e dias frios, pedras, espinhos e até pessoas que passavam por aquela mesma estrada, umas com semblantes rancorosos, outras distraídas, venenosas, falsas, egoístas e outras cheias de amor, mas, todas sabendo, que no final da “estrada” todos teriam o mesmo destino: rostos carcomidos pelas intempéries do tempo, para não dizer que chegariam à velhice e como final, a morte, para uns, o descanso eterno, para outros, é vida nova no paraíso, mas, para aquele menino sonhador, era somente a certeza de ter conseguido chegar ao fim da estrada ileso e sem pagar pedágios.

Tem dia que caminhamos à beira da estrada e sentimos o vento levar nossos pensamentos sem pedir licença. Tem dia que pegamos pétalas de rosas à sua beira e elas nada exalam. Tem dia que vemos passar por ela marés de incertezas e não reagimos. Tem dia que tentamos encontrar outra estrada e sonhar um sonho que almejamos sonhar, mas não conseguimos. Tem dia na estrada que a noite é pesada demais mesmo sem termos pesadelos. Tem dia que nos lembramos do passado sem assombros, mas, tem dia que a vemos cheios de escombros. Tem dia que perdemos alguém na “estrada” que muitas vezes não dávamos o devido o valor. Tem dia... Ah, se tem!

Anos se passaram e hoje sentado à beira daquela mesma estrada e com o pensamento absorto, ele percebera que o seu passado era a estrada que percorrera durante toda a sua existência e este aspecto não devia esquecer jamais, pois foi através desta caminhada longa, entre erros e acertos, com realização profissional ou não, que chegou onde está ou encontrou a  felicidade de haver localizado ao longo dessa “estrada” o amor e realizar alguns sonhos, muitas  vezes pagando pesados pedágios, tributo que a vida lhe impôs e às vezes o dificultou alcançar outros sonhos e objetivos antes de chegar ao seu fim.

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