Será que estamos fugindo de nós mesmos?

sábado, 26 de abril de 2014



Será que você é como eu? Tem dia que mesmo deitado sobre a cama ou estirado sobre o sofá sinto uma vontade danada de levantar e sair andando sem rumo, sem norte. A minha vontade vem do nada e teima em não passar, situação que me deixa confuso, controverso. É como se a minha alma estivesse saindo sozinha do meu corpo e os olhos, que são sua janela, fixos num ponto qualquer, também perdidos. Geralmente isso acontece quando alguém de quem ao longo do tempo até tentamos gostar se aproxima, sem qualquer constrangimento, depois de ter-nos ferido verbalmente, de viver “pegando no pé” da gente, tentar se aproximar, na maior “cara de pau”, como se nada tivesse acontecido, e puxar conversa. Diante desta situação restou-me usar uma espécie de instinto de sobrevivência, de não querer ser contrariado ou um motivo para não se estressar com aquelas conversas inúteis e até fúteis. Então, busco fugir em busca do imprevisível ou finjo de invisível que é a melhor e a única opção para evitar ouvir qualquer bobagem. No entanto, o problema é quando a gente, apesar de toda a vontade, de toda a força que imprimimos a nossa alma para acalentar um coração ferido, não conseguimos dada a frieza e insensibilidade das palavras nele impregnadas. Apesar também de toda a certeza de que eu não deveria continuar no mesmo lugar, pois naquele instante me restava apenas uma espécie de resignação: Sujeitar-me sem conflitos, conformar-me e ficar em silêncio. E o pior de tudo é ter que permanecer sentado ouvindo as mesmas lorotas, fingir ser um moço comportado, que entendeu não serem ofensivas as palavras ditas e ainda continuar atencioso diante de uma agressão sofrida, cuja ferida dificilmente cicatrizará por mais que eu me esforce.

Sempre engulo seco e me calo. Procuro enviar para a região recôndita de meu cérebro o imprestável e não me preocupo em contabilizar os momentos ruins e nem os reclamos enviados porque sei que existem mentes que não se corrigem com o tempo e nem com o auxílio de explicações de renomados doutores. No meu caso, nunca entendi ou continuo não entendendo qual o motivo que aquela pessoa fazia em me criticar, importunar, constranger-me, não me dar o devido valor, não concordar com alguns projetos ou realizações minhas, mesmo sendo todos concretizados com sucesso. Desta luta insana para jamais não ferir meus semelhantes, restou à minha alma e ao meu espírito esquecer essas famigeradas sofreguidões, e livre como a um pássaro e amparado por almas generosas, decidi perambular por aí, leve e solto. Resolvi dar a volta por cima, mesmo sem asas, ver coisas novas, receber novos sorrisos, sorrisos renovados. Conhecer gente diferente e lugares interessantes. Aprender a viver com ou sem a presença desse tipo de gente. Viver com intensidade e sem medo de ser feliz. Sei que ainda é muito cedo para que a minha alma seja condenada a um único lugar. A alma e corpo parados é sinal de morte, mas eu ainda tenho muitos anos pela frente e sei que serei obrigado a continuar ouvindo despautérios de certa pessoa que me abstenho de dizer o nome, fingindo que suas conversas, para mim sem nexo, são as coisas mais cheias de senso de humor e interessantes que eu já tenha ouvido.

Desde pequeno aprendi que, por mais que fossem chatas e me machucassem, as convenções humanas existiam e existem para serem cumpridas. Sem elas, o mundo não seria mundo. Sem elas, ficaríamos perdidos entre uma barbárie e outra. Aprendi, mas não me conformei, pois nunca enxerguei problemas em um mundo sem regras. Nem me considerei um anarquista, pois não sou de esquerda e nem de direita, sou apenas justo, bom e gosto de fazer justiça e ver a justiça ser feita. Odeio também a corrupção e essas são algumas das coisas nefastas que faço questão de serem extirpadas da face da terra. Meus ideais giram única e exclusivamente em torno da idéia de minha própria liberdade e maneira de ser. Os outros podem continuar com suas vidas medíocres, seguindo suas regras medíocres, falando de coisas medíocres, ouvindo músicas medíocres, mantendo conversas medíocres e incapazes de entender porque pessoas se levantam e saem andando para evitar conversas chatas e sem sentido. No fundo, por mais que imagino o contrário de mim mesmo, achava que era um grande egoísta. Tentava prestar atenção no que os outros falavam, mesmo sabendo que todo o esforço seria em vão. Para não contrariar ou me tornar indelicado, acenava com a cabeça em sinal afirmativo ou negativo, seja lá qual fosse à besteira que eu estivesse ouvindo. Sei que isso não é um truque primário ou mesmo eficiente, mas resolve. Um simples aceno com a cabeça tem a vantagem de não querer dizer nada, mas dar ao outro o conforto de que o mesmo está entendendo ou sendo bom ouvinte. 

Apesar de todo o inconformismo e nem aceitar aquelas opiniões contrárias, sentia-me um covarde e fazia questão de continuar ali, inerte, como “bom ouvinte”. Não sabia lidar com os dedos apontados em riste, entendia ser constrangedor ou acenos inoperantes que pudessem mostrar no meu semblante a contrariedade. No fundo, toda a minha revolta não era e não é por não poder subverter cada uma das regras da humanidade. O que deixava ou me deixa aflito era e é justamente não conseguir cumpri-las. Ou achar que não conseguiria. Quero ser como todos os meus amigos e amigas. Quero ser apenas um simples comediante para fazer a alegria deste povo sofrido ou um ator global para repassar para encenar no teatro da vida todas essas maledicências, mas sempre reparando bem que em nossas inconformidades, não se vislumbrará e nem seremos capazes de observar que o mundo, na maior parte ou em todo o seu tempo, está mostrando apenas um grande diálogo de surdos, mudos e cegos, incapazes de ver ou transmitir qualquer sinal que faça sentido ao outro. Mas, quando perceberes isso, não seja mais feliz ou mais triste do que já és. Talvez, nem valha a pena perceber, principalmente se sentirmos totalmente inconforme ou tentando fugir de nós mesmos.

1 comentários:

  1. Belíssima e tocante Crônica amigo, Parabéns... És de uma sensibilidade sabedoria admirável.

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