A utopia pode estar a poucos metros
diante de nós, mas se damos um ela dá dois passos. Se duplicarmos os passos ela
se distancia para além de mais além. Então, para que serve a utopia? Será
aquilo que imaginamos como sendo perfeito, ideal, mas é imaginário? Será que
não sabemos ao certo se é possível alcançar ou realizar? Será que ela pode ser
almejada, ou ser apenas uma fantasia, um mito, uma quimera, um sonho ou simples teoria criada pelo homem.
Em
algumas situações não são bem assim. Com relação à pessoa humana, todas
sonham possuir um pedaço de chão, mas nem todos conseguem. Desde o
descobrimento do Brasil o índio tinha mais do que possui hoje. Na verdade,
quase não tem mais, pois a civilização avançou demais e foi tomando seus
quinhões de terra selva adentro. Diferentemente desses habitantes de florestas,
as pessoas chamadas por esses selvagens de “homens brancos” e que vivem noutra
selva - a de “pedras”, construídas por eles, muitas delas estão sem teto
também, encontram-se abandonadas, algumas ocupam clandestinamente os espaços
públicos e privados, não possuindo um pedaço de chão para nele construir um
barraco, por mais simples que for. Uns cem números de habitantes são
desabrigados pelas chuvas, pelos desmoronamentos, pelos incêndios, por outros
eventos provocados pela natureza e até pela própria ação do homem, os quais,
certamente, desejariam para reconstrução de suas vidas, apenas um pequeno
pedaço de chão, porque para eles, um pedaço de chão é muito mais que ter onde
morar. É ter direito a uma vida mais digna e melhor protegida. É poder plantar
sementes e colher sonhos; é semear projetos e gerar filhos num solo fértil,
tornando-se claro e notório, que tudo se frutificará em coisas prósperas e lhes
darão alegrias no amanhã. Ter um pedaço de chão vai além de abrigar corpos.
Aconchega. Conforta. Até na hora sinistra da morte precisa-se de um pedaço de
chão. E nem nessas horas todos têm o privilégio de adquirir um espaço digno
para sua última morada. Todos querem. Muitos sonham, mas nem todos conseguem um
pedaço de chão...
Repito: Até na hora sinistra da morte precisa-se de
um pedaço de chão e nessas horas nem todos têm o privilégio de adquirir um
espaço digno para sua última morada. E ao repetir essa frase, lembrei-me de
tantas pessoas que são desalojadas de suas casas, de casebres, de barracos, sem
a menor sensibilidade e amor ao próximo. Com essas nuances, surgiram as primeiras
tentativas de mudança nesta nossa terra que chamo de Reino da Utopia. É como se
ele vibrasse sobre os pés de pessoas insensíveis que colocam obstáculos para que
não se encontre um novo eixo. Mas, o tempo não pode esperar, o sol se vai e
logo vem escuridão, que descerá sobre o Reino escurecendo-o sem dó. É como se
ele estivesse protegido por uma grande placa de aço, escura, pesada, sem fim.
As pessoas parecem acordar de um sono profundo e algumas sentem seus corpos
convulsionarem-se, retorcerem-se, curvarem-se em choro, expondo o que nem elas
mesmas tinham conhecimento, um lado oculto, mas, felizmente, a escuridão
esvaiu-se como num passe de mágica e o sol tomou o seu lugar para iluminar o
caminho daqueles que partiram e partem para se despertarem em outra dimensão ao
lado do Pai Celestial.
Tem dia que não tenho
motivos para sonhar, no entanto, há sempre um desejo ardente de aventurar num
mar de sonhos quando vejo a arte ser pincelada ou massageada por mãos mágicas
de alguns amigos, cuja beleza lá estampada ao ser colocada num pedestal ou
fixada numa parede, às vezes, como leigo, as enxergo como se elas fossem apenas
uma utopia, mas mesmo assim, ao tentar decifrá-las, uso as asas de meus sonhos
e me apego a uma linha de pensamento imaginário, pois sei que eles nos dão
aquilo que a realidade nos nega. Mas hoje, a Utopia de quem falo, está mergulhando
em uma maldição indecifrável, o sol vermelho que beija a terra, todo poderoso,
magnífico, absoluto e que faz recair sobre a cidade fachos de luz únicos, agora
se curva novamente diante da noite. Fecha-se a cortina do tempo e diante daquelas
cenas de construções devastadas, natureza arruinada e um vazio supremo, todos
se sentem perdidos, cada qual procurando respostas, fugas de um pesadelo, não
entendendo esses indivíduos que o Reino da Utopia adormece sobre um pedaço de
chão, que vaga no espaço celeste, mostrando coisas mirabolantes, cidades
efervescentes que iluminam todos os covis, dos quais, devíamos aprender a
destruí-los, um a um; procurar extrair todos os nossos medos e receios, para
posteriormente, termos uma vida digna e a chance de um dia voltarmos ao convívio
de nossos entes queridos. Mas, é bom ficarmos precavidos, pois se o sinistro
relógio tocar por doze vezes, anunciando meia-noite pode ser algo se apoderando
de Utopia; podem ser estranhas criaturas saindo de seus covis para atacar
aqueles que ali se acomodam, e aí, havemos de entender que nada mais é do que
um jogo de sobrevivência, talvez por tempo determinado ou, até que aquele
relógio utópico silencie-se diante das intempéries do tempo e ceda um pouco, de
modo que os monstros sumam e cada um possa despertar do transe, voltar a viver
um dia normal e entender que aquele pedaço de chão tão sonhado nada mais é do que
uma utopia.
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