Torquato e a Pinguela

sábado, 3 de setembro de 2011

Torquato era um pequeno agricultor solteirão. Depois de meditar muito sobre a melhor maneira de atravessar o rio, já que a única ponte de madeira ficava a cinco quilômetros de sua casa, resolveu construir uma pinguela sobre ele.  Do lado de lá, de vez em quando, ele via passar uma linda mulher, corpo esbelto, pernas torneadas e cabelos castanhos caídos sobre os ombros. Um colírio para os seus olhos. Aqueles momentos mais pareciam um sonho e a construção da pinguela talvez o acordasse para a vida e o ensinasse a viver dias melhores.

Sabendo que a travessia era insegura e a sensação de não conseguir alcançar a outra margem poderia ser sentida a cada passo, mesmo assim não titubeou, cortou uma enorme árvore que ficava às margens do rio e a ponta cheia de galhos caiu do outro lado. Aparou os galhos e tirou as lascas como se fosse um escultor. Pronto! Estava construída a formosa pinguela. Ficou observando-a, chegou bem perto do barranco, olhou para baixo e sentiu-se como se estivesse num prédio de quatro andares e depois, lembrou-se que além do medo de altura sofria de labirintite. Entretanto, para quem sentia medo e não tendo alternativa, se viu obrigado a enfrentar a sensação da travessia, até porque precisava  encontrar aquela mulher.
Passados alguns anos visitei o Torquato e numa tarde quente de verão, enquanto o sol se escondia no horizonte, fiquei observando atentamente aquela pinguela e aí me veio à mente que a nossa vida está repleta de momentos semelhantes. Muitas vezes somos forçados a atravessar situações difíceis, sem  nenhuma    segurança e equilíbrio. Muitas vezes pensamos até em retroceder ou sentar a margem daquilo que achamos impossível construir. O impossível no mundo de hoje é sobreviver ou viver em linha reta, avançar e superar obstáculos. A menos que a opção seja por não amadurecer e não crescer, mas sabendo que ultrapassar obstáculos faz parte do itinerário de qualquer ser humano. Chegará o dia em que será necessário que levantemos nossos próprios voos e experimentemos novos ares, pois somente conseguem sucesso quem  avança, independentemente da situação em que se encontram como foi o caso de Torquato que enfrentou o seu medo e pode alcançar na outra margem o seu grande amor.
Vivemos num mundo de altos e baixos, mesmo para aqueles que se dizem seguros quando chegam ao ponto final.  Na estrada da vida muitas vezes somos quase que obrigados a passar por algumas “pinguelas” que balançam nossa estrutura interior. Damos alguns passos, chegamos a vacilar e muitas vezes nem damos    conta de que não há consistência quanto à direção a ser seguida, não obstante sabermos da necessidade de ir adiante mesmo não tendo toda a certeza e segurança necessárias para alcançar o que almejamos. Quando conseguimos passar pela pinguela da vida e pisar em solo firme é sinal que vencemos os obstáculos, superamos nossas limitações e sentimos mais leves e fortalecidos. A nossa vida é cheia de “pinguelas” e não adianta a gente querer se desviar delas, pois elas surgirão ao seu tempo e quando surgirem, nada de receio e ansiedade, pois, depois do esforço empreendido, vem a alegria de ter alcançado o lado de lá, como aconteceu com Torquato.

VANDERLAN DOMINGOS DE SOUZA Advogado, escritor e Diretor da UBE – União Brasileira de Escritores e articulista do Diário da Manhã. E-mail: vdelon@hotmail.com

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